domingo, 29 de maio de 2011

Carta a um ex-Presidenciável

"Não se mede a grandeza de um homem pelos cargos que ele ocupa, mas pelos métodos utilizados para alcançá-los"


Eu escrevi o texto abaixo logo após as eleições presidenciais do ano passado. Naquela oportunidade, o enviei apenas para alguns conhecidos. Já se passaram sete meses, entretanto penso que o jogo sujo feito por um dos lados –  com o apoio, lamentavelmente, de alguns prelados da Igreja Católica e de pastores evangélicos – ainda está vivo nas mentes dos brasileiros. Portanto, decidi divulgá-lo neste blog para que outras pessoas que porventura o acessem reflitam mais uma vez e envidem esforços pessoais para que tal fato repugnante não volte a se repetir em nosso país. O texto é exatamente o mesmo como concebido originalmente.  


CARTA A UM EX-PRESIDENCIÁVEL

Inicialmente gostaria de esclarecer que não sou filiado a nenhum partido político. Não sou jornalista, não sou escritor e também não sou um intelectual. Sou apenas um brasileiro que anseia ver um país mais justo ainda nos anos da sua vida. 

É legítimo almejar ser Presidente do Brasil? A resposta óbvia é sim. Do príncipe dos sociólogos ao torneiro mecânico, qualquer brasileiro pode desejá-lo e empenhar-se nesse mister. Você também tem todo o direito. Querer voltar ao poder, é direito de algum partido político? Não há dúvidas quanto a isso. Todavia, o que pode ser condenável nessa perspectiva, é o caminho trilhado.

Não se mede a grandeza de um homem pelos cargos que ele ocupa, mas pelos métodos utilizados para alcançá-los.

Se tivesse jogado um jogo limpo como disse São Paulo: combati o bom combate talvez hoje você já estivesse preparando o terno para a sua posse. E se não, como realmente aconteceu, pelo menos você teria saído da campanha com a dignidade dos grandes seres humanos, com o legítimo direito de almejar ocupar o mais alto cargo da República do Brasil. Ao contrário disso, você manchou a sua biografia com a campanha sórdida que foi regurgitada na internet pelos seus defensores e aliados, com a sua, no mínimo, complacência.

O verdadeiro líder não precisa apequenar o oponente. Ele se agiganta pela suas virtudes. Você poderia ter demonstrado nobreza de espírito desautorizando a calúnia, não compactuando com a difamação. Ecos de “O Príncipe,” de Nicolau Maquiavel, foram ouvidos nesta campanha.

Dilma lutou contra a ditadura? Você também lutou. Dilma foi considerada subversiva? Você também o foi. Dilma teve a prisão decretada? Você também. Você sofreu no exílio? Dilma também sofreu, pois foi presa e torturada. Você certamente não foi preso porque saiu do Brasil. Dilma acusada de ser terrorista em plena campanha! A luta de uma jovem de pouco mais de 20 anos contra a ditadura, idealista como você à época, ocorrida há 40 anos! E você assistindo tudo do alto do seu staff de campanha, deixando que pessoas mais simples ou incapazes de distinguir o joio do trigo, muitas decentes e bem intencionadas, não obrigatoriamente as mais pobres, fossem dissuadidas pelos difamadores da internet e pelos ultraconservadores, incluindo alguns padres e pastores, indignos desses títulos na acepção comum das palavras.    

E a questão do aborto? Acusar a Dilma de ser a favor do aborto, quando a sua própria mulher o praticou! Talvez premida por uma situação adversa, é compreensível, não se pode julgá-la. Entretanto o que é inexcusável e de um cinismo e hipocrisia sem tamanho é deixar a sua mulher afirmar que “ela (Dilma) é a favor de matar criancinhas”, numa total distorção e descontextualização do tema. Foi uma atitude não só deplorável, mas acima de tudo irresponsável.

E a farsa da bolinha de papel? Do rolo de fita adesiva? Ah, e a rede globo? Sempre a rede globo! E o “close do Kamel” nos momentos finais do último debate? E o empenho do jornal folha de são paulo para obter a ficha da Dilma da época da ditadura às vésperas do 2º turno? Por que não a sua também? Isso é ou não manipular a informação em favor de um projeto político?

Tudo isso rendia os votos dos incautos para você! Então, deixa rolar. 

Você lutou contra a ditadura, foi líder estudantil, senador, ministro, governador do mais importante estado brasileiro e prefeito de uma das maiores cidades do mundo. Que currículo invejável! Poderia ter inserido um belo capítulo na sua biografia, mas a manchou com a nódoa imoral que foi a sua campanha.

Como foi irresponsável a sua atitude ao contribuir para que a Nação se dividisse com base em mentiras, calúnias e intolerância! Tomara que as forças do bem e os homens e mulheres dignos do seu partido, envergonhados com a campanha do mal que você fez, não permitam que isso continue e que a xenofobia, qualquer que seja a matiz, se instaure no Brasil. Tomara que a Dilma tenha a virtude das grandes mulheres e a sensibilidade das mães para conciliar os “... filhos deste solo... pátria amada, Brasil.”

Não vou me alongar.

Por que tentar chegar à Presidência do Brasil ferindo tantos valores? O que há por trás do apoio da grande imprensa à sua candidatura? Será que o barulho das Cataratas de Foz do Iguaçu faz algum sentido? 

Ao deitar a cabeça no seu travesseiro, no mais íntimo da sua casa, no silêncio da noite, quando todos dormem, agora que passou o fervor da campanha, o que diz a sua consciência? Pedir desculpas ao povo brasileiro seria uma demonstração de grandeza espiritual.

Ser obrigado a compartilhar com você este momento, é profundamente triste. Também é a causa de uma enorme indignação. Quisera ele não tivesse existido.

Saulo Alves de Oliveira
Um brasileiro comum

domingo, 22 de maio de 2011

A morte de Bin Laden




“Duas coisas são infinitas: o universo e a estupidez humana. Mas, no que respeita ao universo, ainda não adquiri a certeza absoluta.”

Albert Einstein (1879 - 1955)






11 de Setembro de 2001. Radicais islâmicos atacam os Estados Unidos e destroem um dos maiores símbolos do poderio econômico norte-americano: o World Trade Center. Numa operação inédita, os terroristas projetam dois aviões contra as chamadas Torres Gêmeas, de cerca de 417 metros de altura, cada uma, imolando-se a si próprios – tais quais camicases da 2ª Guerra Mundial – e matando de imediato todos os passageiros e as tripulações dos aviões.

Minutos após os impactos, as duas torres desabam e formam um amontoado de concreto, aço, móveis, objetos pessoais, corpos humanos... Centenas e centenas de pessoas inocentes, inclusive de outras nacionalidades, sucumbem ao atentado. Número oficial de mortos: 2819 pessoas. Uma verdadeira demonstração da insanidade humana. Em duas palavras: uma barbárie.     

O então Presidente norte-americano, George W. Bush, cristão metodista, se autoproclama enviado de Deus e inicia uma “cruzada” moderna de caça ao grupo terrorista que perpetrou o atentado, presumivelmente chefiado pelo saudita Osama bin Laden. O Sr. Bush, porém, não conseguiu seu principal objetivo, isto é, matar Bin Laden.   

01 de Maio de 2011. Agentes especiais norte-americanos, provavelmente todos cristãos – será que eles oraram quando saíram para a operação? –, invadem secretamente o Paquistão, sem autorização do governo daquele país. Em seguida, invadem uma casa na cidade de Abbottabad e matam o famoso – para o mundo ocidental, principalmente – terrorista, Osama bin Laden; para muitos muçulmanos, um herói. O Presidente dos Estados Unidos, Barack Obama – cristão evangélico e Nobel da Paz (?) –, que autorizou a operação, vai à TV e anuncia: “...justiça está sendo feita”.

Será mesmo justiça? Então, o que é justiça?

Não sou um homem afeito às leis, entretanto me parece que fazer justiça seria prendê-lo, apurar a verdade, julgá-lo e condená-lo, se comprovada a sua culpa. Um comando super treinado, armado com o que há de mais moderno, que executa com um tiro na cabeça um homem desarmado, está mais para vingança ou desforra, incompatível com a fé que o Sr. Obama e a grande maioria dos norte-americanos professam. Parece que em questões de estado não se dá a outra face, tal qual preconizou Jesus. Parece que o que vale mesmo é o “olho por olho, dente por dente... golpe por golpe”, de Moisés. Ou eu estou sendo ingênuo?
        
Todavia, minha ingenuidade, ou hipocrisia, não chega ao ponto de admitir que o ser humano jamais pense em fazer justiça com as próprias mãos. Quiçá eu mesmo, passando por situação semelhante, tivesse esse sentimento tão selvagem, mas humano, demasiadamente humano. Resquícios da fera que nós fomos um dia? Talvez!

Lembram-se do menino João Hélio, que foi barbaramente assassinado no dia 07 de fevereiro de 2007? Um dos assaltantes arrancou com o veículo em alta velocidade tendo o garoto preso ao cinto de segurança pelo lado de fora do carro. O garoto foi arrastado por sete quilômetros e pedaços do seu pequeno corpo foram arrancados pelo choque com o asfalto. Ao final do trajeto, o corpo do menino estava totalmente irreconhecível. No primeiro momento, seria compreensível se os pais desejassem vingar a morte do filho? Responda para você mesmo. Mas, entre o desejar e o executar, há uma enorme distância.

Que haja sentimentos de vingança em cidadãos comuns, é compreensível, porém em uma instituição, como é o governo dos Estados Unidos, é inaceitável. O que há por trás de tudo isso?

Quando vi na televisão o povo norte-americano vibrando por causa da morte de Bin Laden, jovens batendo no peito e gritando U-S-A! U-S-A! U-S-A!, eu me lembrei das imagens dos povos árabes/muçulmanos vibrando nas ruas de suas cidades quando homens-bomba se autoexplodem e levam consigo dezenas de pessoas inocentes no ocidente ou em Israel. Isso me faz temer pelo futuro da humanidade. E as palavras de Einstein, citadas no início da página, ecoam nos meus ouvidos.     

Há justificativas para ações terroristas que destroem vidas humanas inocentes? A resposta é um retumbante “não”.

Há explicação para ações como as executadas por grupos radicais muçulmanos? Sim. No entanto, acho que não há somente uma explicação. São conseqüência de anos de opressão, do imperialismo, da condescendência das nações ricas com regimes que oprimem o povo, enquanto os interesses daquelas não são contrariados. Acrescente-se a isso o fanatismo religioso levado ao extremo e estará pronto o caldo explosivo que poderá levar a humanidade à destruição.

O mundo está mais seguro sem Osama bin Laden?  Obviamente, não.

O mundo só estará mais seguro quando a questão da Palestina estiver resolvida e houver mais justiça entre as nações. O mundo só estará mais seguro quando as nações ricas fizerem às nações pobres apenas aquilo que querem que os outros lhes façam.

Enquanto interesses subalternos das grandes corporações – leia-se ambição desmedida pelo petróleo, venda de armas... – se sobrepuserem aos interesses dos povos, não existirá segurança na Terra, pois sempre haverá aqueles que se revoltarão contra a opressão, valendo-se, lamentavelmente, dos meios mais bárbaros e vis possíveis.

Enquanto religião, cultura, cor da pele, classe social, riqueza... forem parâmetros para grupos ultra-radicais se julgarem superiores e melhores que outros povos, não haverá paz na Terra. 

O terrorismo não acabou e talvez jamais acabe, enquanto perdurar o “status quo” das nações ricas, tendo à frente o Tio Sam.

Eu escrevi o texto “Pálido Ponto Azul” – você poderá lê-lo logo abaixo – uns dois meses antes dos acontecimentos recentes. Ele tem tudo a ver com o que estamos comentando. A Terra é tão pequena na vastidão do Universo e totalmente sujeita aos caprichos da natureza. Basta-nos ser atingidos por um cometa ou asteróide como o que atingiu a Terra há cerca de 65 milhões de anos e destruiu os dinossauros. E todos os animais superiores que habitam este planeta poderão ser extintos, inclusive os seres humanos.

Será que já não bastam os terremotos, tsunamis, chuvas torrenciais, deslizamentos de terra, vulcões, secas e tantos outros predadores naturais, que muitas vezes ceifam centenas de milhares de vidas? Não precisamos de mais um predador do homem: o próprio homem.          

Saulo Alves de Oliveira         

domingo, 15 de maio de 2011

Pálido Ponto Azul

 
Fotografia da Terra tirada de uma distância de 6 bilhões de quilômetros
"Pálido Ponto Azul” é o título de um livro escrito em 1994 pelo cientista e astrônomo Carl Edward Sagan. O título do livro foi inspirado numa famosa foto da terra tirada pela nave Voyager 1, da NASA, a Agência Espacial Americana. Carl Sagan também foi o realizador, juntamente com sua esposa Ann Druyan, de uma famosa série de TV - “Cosmos” - lançada em 1980. Para muitos, Sagan foi o maior divulgador da ciência que o mundo já conheceu.

As naves Voyager 1 e Voyager 2 são duas sondas espaciais lançadas pela NASA em setembro e  agosto de 1977, respectivamente. Assim como fizeram os grandes navegadores do passado, que viajaram pelos oceanos desconhecidos para descobrir e conhecer novas terras, elas foram enviadas para perscrutar e explorar o sistema solar.

Até aquela época, a foto da terra tirada de uma posição mais distante era a famosa “A Bolinha Azul”, que pode ser vista abaixo. A imagem foi obtida pela tripulação da Apollo 17, a caminho da lua, de uma distância de aproximadamente 55 mil quilômetros, no dia 7 de dezembro de 1972. Apollo 17 foi a sexta e última missão do Projeto Apollo que levou o homem à Lua.     

Quando as naves Voyager já estavam no espaço, Sagan diz em seu livro:

“Achei que seria uma boa ideia, logo depois de Saturno, que elas lançassem um último olhar para casa. Eu sabia que, vista a partir de Saturno, a Terra pareceria demasiado pequena para que a Voyager distinguisse algum detalhe... Parecia-me que outra fotografia da Terra, tirada de um ponto centenas de milhares de vezes mais distante, poderia ajudar no processo contínuo de revelar-nos nossa verdadeira circunstância e condição.”
Apesar dessa enorme distância - Saturno fica a cerca de 1,4 bilhões de quilômetros da Terra -, temia-se que, ao apontar as câmeras para a Terra, portanto para perto do Sol, haveria o risco de queimar o sistema de câmeras da nave espacial. Seria, portanto, melhor esperar até que fossem obtidas todas as imagens científicas dos demais planetas.

Somente em 1990, quando as naves já tinham ultrapassado as órbitas de Netuno e Plutão, a Administração da NASA autorizou as imagens sugeridas por Sagan. Então, em fevereiro daquele ano, a Voyager 1 - que estava a 6 bilhões de quilômetros da Terra e deslocando-se a uma velocidade de 60 mil quilômetros por hora - foi alcançada por uma mensagem da Terra que a fez redirecionar suas câmeras para o já tão distante planeta. Posteriormente as imagens foram enviadas para a Terra, porém, mesmo viajando à velocidade da luz (300 mil quilômetros por segundo) demoraram cinco horas e meia para chegar até nós.     

A foto no início da página é a imagem da Terra vista de um lugar tão distante, apenas um minúsculo ponto, que parece preso em um raio de Sol na imensidão do Universo. Ali está a nossa casa. O lar de todos os seres humanos.

Reproduzo abaixo, o espetacular comentário de Carl Sagan acerca desse tão querido e tão maltratado “Pálido Ponto Azul”, em seu magistral livro de mesmo nome: 
“Nós podemos explicar o azul-pálido desse pequeno mundo porque o conhecemos muito bem. Se um cientista alienígena, recém-chegado às imediações de nosso Sistema Solar, poderia fidedignamente inferir oceanos, nuvens e uma atmosfera espessa, já não é tão certo. Netuno, por exemplo, é azul, mas por razões inteiramente diferentes. Desse ponto distante de observação, a Terra talvez não apresentasse nenhum interesse especial.

Para nós, no entanto, ela é diferente. Olhem de novo para o ponto. É ali. É a nossa casa. Somos nós. Nesse ponto, todos aqueles que amamos, que conhecemos, de quem já ouvimos falar, todos os seres humanos que já existiram, vivem ou viveram as suas vidas. Toda a nossa mistura de alegria e sofrimento, todas as inúmeras religiões, ideologias e doutrinas econômicas, todos os caçadores e saqueadores, heróis e covardes, criadores e destruidores de civilizações, reis e camponeses, jovens casais apaixonados, pais e mães, todas as crianças, todos os inventores e exploradores, professores de moral, políticos corruptos, “superastros”, “líderes supremos”, todos os santos e pecadores da história de nossa espécie, ali - num grão de poeira suspenso num raio de sol.

A Terra é um palco muito pequeno em uma imensa arena cósmica. Pensem nos rios de sangue derramados por todos os generais e imperadores para que, na glória do triunfo, pudessem ser os senhores momentâneos de uma fração desse ponto. Pensem nas crueldades infinitas cometidas pelos habitantes de um canto desse pixel contra os habitantes mal distinguíveis de algum outro canto, em seus frequentes conflitos, em sua ânsia de recíproca destruição, em seus ódios ardentes.

Nossas atitudes, nossa pretensa importância, a ilusão de que temos uma posição privilegiada no Universo, tudo é posto em dúvida por esse ponto de luz pálida. O nosso planeta é um pontinho solitário na grande escuridão cósmica circundante. Em nossa obscuridade, no meio de toda essa imensidão, não há nenhum indício de que, de algum outro mundo, virá socorro que nos salve de nós mesmos.

A Terra é, até agora, o único mundo conhecido que abriga a vida. Não há nenhum outro lugar, ao menos em futuro próximo, para onde nossa espécie possa migrar. Visitar, sim. Goste-se ou não, no momento a Terra é o nosso posto.

Tem-se dito que a astronomia é uma experiência que forma o caráter e ensina a humildade. Talvez não exista melhor comprovação da loucura das vaidades humanas do que esta distante imagem de nosso mundo minúsculo. Para mim - e para mim, Saulo, também -, ela sublinha a responsabilidade de nos relacionarmos mais bondosamente uns com os outros e de preservarmos e amarmos o pálido ponto azul, o único lar que conhecemos.” 
A Bolinha Azul
 Não vou fazer qualquer comentário acerca das palavras de Carl Sagan. Acho que sua mensagem é profundamente clara. Lamentavelmente, Sagan faleceu em dezembro de 1996, aos 62 anos, depois de uma árdua batalha de dois anos contra uma rara e grave doença na medula óssea. Apesar de morto há mais de 14 anos, Sagan ainda vive em suas palavras e em seu extraordinário livro “Pálido Ponto Azul”. Elas me tocam de modo muito profundo. Deixo, portanto, ao leitor a tarefa de refletir e tirar suas próprias conclusões.

Atualmente, a Voyager 1 encontra-se a uma distância de aproximadamente 17,6 bilhões de quilômetros da Terra, talvez na fronteira do sistema solar.

Saulo Alves de Oliveira 

domingo, 1 de maio de 2011

A resposta que não é "A Resposta"

Imagem baseada em uma foto de Glorinha, minha sogra, aos 18 anos de idade, retirada de um álbum de scrapbook preparado por sua filha Sulanira


Nós ainda não sabemos se há vida em outros planetas. No universo conhecido, existem bilhões e bilhões de galáxias com seus trilhões e trilhões de estrelas e planetas. Por que só a Terra foi agraciada com a vida? Pensar assim é muita pretensão do ser humano. Seria um enorme desperdício. No entanto, de uma coisa nós temos certeza: não há simplesmente vida na Terra, há também vida inteligente. E algo une todos os seres vivos. Todos nascem, crescem, se reproduzem e morrem. Dos vermes ao ser humano. Do menor vegetal à sequoia gigante que pode viver por milênios e, neste período, ultrapassar os 100 m de altura e algumas dezenas de metros de circunferência em sua base. É uma lei natural. Dura e muitas vezes nos parece cruel. A morte é talvez o que há de mais inexorável na existência de todos os seres vivos que habitam a Terra, nosso maravilhoso planeta. Seu caráter inevitável também é certo.
  
Ela não tem qualquer escrúpulo ao levar recém-nascidos ou adolescentes deixando seus pais inconsolados.  Também não se comove perante crianças indefesas que choram a morte de seus pais, seus protetores.

É o trabalho implacável da natureza, que não é boa nem má, mas tão somente indiferente.

Eu já passei por algumas experiências de morte de pessoas muito próximas a mim. A primeira ocorreu quando eu ainda era criança, há quase 50 anos. Minha mãe estava grávida de uma menininha que receberia o nome de Salimar. Lembro de ver minha mãe, Maria Carlos, à maquina de costura bordando as roupinhas para o pequeno enxoval. Eu era o caçula da família e aguardava com ansiedade a chegada da minha nova irmãzinha. Infelizmente ela nasceu morta. Sofri bastante... Meu sonho se frustrou... A morte de Salimar, entretanto, não me deixou traumas emocionais.

Os anos se passaram. Cresci... casei... e tive filhos. Em 1989, perdi minha sogra que tinha apenas 51 anos de idade.

Em 1998, meu sogro nos deixou aos 91 anos. Ele era conhecido como Joca Macedo. Era um homem de princípios rígidos e muito rigoroso no trato com a família, não que a maltratasse, pelo contrário, era um pai zeloso, mas não aceitava questionamento das suas ordens. Joca teve uma vida muito difícil, trabalhou muito, desde sua infância em Lagoa de Pedras/RN até aos 65 anos quando, após alguns problemas de saúde, complicações da tireóide e muito estresse, foi obrigado a se aposentar. Foi uma pessoa extremamente correta em seus negócios, tanto é que, após várias décadas como comerciante, não ficou rico.

Entretanto, por trás daquela aparência de austeridade, havia um ser humano brincalhão, que gostava de dizer coisas engraçadas, até contar piadas. Certa vez ele me perguntou: “Você já viu um cachorro do rabo pra frente?” Pensei um pouco e, obviamente, respondi “não.” Ele arrematou: “Todo cachorro é cachorro do rabo pra frente, pois do rabo pra trás não tem nada.” Joca deixou saudades.

Em 2006 foi a vez de Maria Carlos partir aos 81 anos de idade. Minha mãe era uma pessoa de difícil convivência mas sei que ela me amava e eu também a amava. Eu a respeitava com sinceridade e sei que a recíproca era verdadeira.

Eu trabalhei no Recife durante quase onze anos e viajava nas madrugadas das segundas-feiras e só retornava nas sextas-feiras seguintes, à noite. Sinto muito sua falta e jamais esquecerei os seus beijos carinhosos e sua mão que afagava o meu rosto nos domingos à noite quando ela ia comigo até o portão de sua casa para se despedir de mim. Tantas vezes ela me disse: “Meu filho, quando vai acabar esse seu sofrimento? Sua vitória será grande.” Era uma forma de me consolar. Ela passou todo esse tempo orando pelo meu retorno para Natal, no entanto não teve o prazer de alcançá-lo. Eu quase cheguei a dizer-lhe: “Mamãe, não precisa mais orar por isso.” Quem me dera encontrá-la para abraçá-la e conversarmos ao menos cinco minutos.

Minha mãe era uma crente sincera e muita preocupada quanto ao cumprimento dos preceitos bíblicos à risca. Ela era, junto com meu pai, que ainda vive, uma espécie de ancoradouro para o meu barco durante as revoltosas ondas do mar da vida. Eu não lhe confidenciava todas as minhas dificuldades, porém, estar ao seu lado ou apenas saber que ela existia, já era um grande bálsamo para a dor.

Já faz mais de quatro anos que Maria Carlos se foi. Só ficaram a saudade e o prazer de saber que ela foi o veículo que me trouxe ao mundo para desfrutar dessa coisa tão sublime e extasiante que é a vida.     

Relatei os fatos na forma acima apenas para apresentá-los cronologicamente. Todavia quero dar ênfase ao caso da minha sogra, pois é a razão principal dessa reflexão.

Seu nome era Maria da Glória de Oliveira Macedo, conhecida como Glorinha. Era uma boa esposa, mãe, dona de casa e sogra. Serei eternamente grato pela ajuda que nos deu, a mim e à minha esposa, quando nossos filhos eram pequenos. Assumir os afazeres de uma casa, atender a um marido 32 anos mais velho – portanto de outra geração –, cuidar de três outros filhos e muitas vezes ficar com uma neta o dia todo nos primeiros anos de vida, sem reclamar, só mesmo uma pessoa muito especial. Jamais vi Glorinha demonstrar consaço. Jamais vi qualquer demonstração de má vontade em seu rosto. Sempre fui bem recebido em sua residência. Nunca lhe dei um beijo ou um abraço. Lamento profundamente essa minha atitude. Se eu pudesse voltar no tempo! Quem sabe um dia a ciência consiga essa façanha.

Além de tudo isso, minha sogra era uma cristã evangélica sincera e dedicada. Frequentava regularmente os cultos e ainda encontrava tempo para ensinar na Escola Bíblica Dominical e, o que era muito importante para ela, visitava os doentes todas as semanas rigorosamente. Foi muitas e muitas vezes ao hospital do câncer levar uma mensagem de consolo aos que lá estavam e não raro baixava-se e falava ao ouvido dos doentes terminais.

Em 1988 minha sogra começou a perder peso e a enfraquecer. Em janeiro do ano seguinte, a doença foi diagnosticada: câncer no intestino grosso com metástase no fígado. Parecia uma ironia. Aquela que consolara tantas vítimas do câncer, agora também era vítima do mesmo mal. Menos de dois meses depois, Glorinha nos deixou.

Lembro como tudo aconteceu naquela noite. Ela estava muito mal, então a família resolveu levá-la para o hospital. Já tarde, uma de suas irmãs disse: “Vão para casa, eu passo a noite com Glorinha.” De madrugada, não sei ao certo a hora, o telefone tocou e uma voz falou: “Venham para o hospital, pois Glorinha está morrendo.” Ao entrar no quarto do hospital, me deparei com uma cena que jamais esquecerei. Glorinha inerte sobre a cama, ainda com o tubo a insuflar-lhe oxigênio - lembro-me do barulho característico do gás sendo expelido -, e um fio de sangue a escorrer-lhe do canto de sua boca.

Não pude conter a emoção. Saí para o corredor do hospital e chorei profundamente. Não eram apenas lágrimas de tristeza pela morte da minha sogra. A essência do meu ser também chorava, pois senti uma enorme decepção. Algo se foi junto com ela. Naquele momento - anos depois eu descobri - algumas coisas começaram a morrer dentro de mim.

Talvez mais do que seus filhos, eu não acreditava que ela morreria daquela doença. Por quê?, pode alguém perguntar. Porque eu tinha fé e a Bíblia diz “...pois em verdade vos digo que, se tiverdes fé como um grão de mostarda, direis a este monte: Passa daqui para acolá, e ele há de passar; e nada vos será impossível.” Portanto, enquanto havia vida, eu acreditava que ela seria curada. Eu orei muito por isso.

Jesus também afirmou certa vez: “Pedi, e dar-se-vos-á; buscai, e achareis; batei e abrir-se-vos-á. Pois todo o que pede, recebe; e quem busca, acha; e ao que bate, abrir-se-lhe-á.”          
                
Eu dissera ao monte “joga-te ao mar” e ele sequer se mexeu. Seria a minha fé menor do que um grão de mostarda? É possível!

Eu pedi, pedi, e obtive o silêncio como resposta. Não me convence nem me satisfaz a teologia que diz que o silêncio de Deus é uma resposta. Talvez algumas pessoas creiam assim porque isso lhes traz conforto.

Eu bati, bati, e a porta não se abriu. Talvez eu tenha batido na porta errada.

Na verdade, eu fui reprovado no primeiro grande teste da minha vida. E isso teve um custo extremamente importante. Quem sabe um dia eu volte ao assunto!    

Já se passaram mais de 22 anos e durante muito tempo eu questionei o porquê da minha sogra morrer tão jovem e naquelas condições. E jamais encontrei "A Resposta".

Contudo, hoje eu sei por que Glorinha Macedo morreu aos 51 anos de idade. A resposta está neste texto. Caberá a você identificá-la, se for do seu interesse.

Saulo Alves de Oliveira

Nem sempre o legal é ético ou moral

Alguns comportamentos humanos são de uma baixeza de caráter inominável. Esta afirmação se aplica a grupos de pessoas dentro dos mais diversos segmentos da nossa sociedade – religiosos (de qualquer matiz), políticos, medicina, justiça, negócios... –, ainda que, em algumas situações, não haja infração de quaisquer leis. Tratar de todos os casos, entretanto, não é o objetivo deste texto.     

Certos indivíduos se autodenominam “servos de Deus”, porém estão mais para “servos de Mamom.” São mestres na arte da dissimulação e na prática de aproveitar-se da ingenuidade de pessoas simples. Não denomino assim aqueles que não tiveram a oportunidade de estudar e de preparar-se intelectualmente. Refiro-me a todos aqueles que, qualquer que seja o seu nível de educação formal, são extremamente crédulos e não têm a menor capacidade de ler a verdade nas entrelinhas dos discursos e na prática de muitos oportunistas que surgiram como ervas daninhas no meio evangélico.

Parece que isso já era comum numa grande nação do norte. Agora, infelizmente, esse verdadeiro câncer social tem se espalhado em nosso país.

Os discursos são muito parecidos. Semeie um aluguel, isto é, doe um aluguel, e colha bênçãos; doe pelo telefone e receba uma unção financeira; seja parceiro de Deus (?) nessa obra doando dinheiro; seja ajudante do bispo Fulano e venda seus próprios bens e entregue para a igreja; seja colaborador de Deus (?) comprando (meus) livros, (meus) DVDs, (minha) revista, (meu) jornal e (minha) TV por assinatura; associe-se e peça o carnê para colaborar mensalmente. Alguns chegam ao cúmulo de fazer a sórdida proposta: “Prove a sua fé como fez Abraão e doe tudo para o Senhor,” na verdade, para a igreja.

Quem pode trazer R$ 1.000,00 até terça-feira? E R$ 500,00? Ou R$ 200,00? Ou R$ 20,00, R$ 10,00? – pergunta o inescrupuloso líder. E os trouxas prontamente o atendem, muitas vezes tirando da boca dos próprios filhos. Se alguém estiver lendo essas palavras e se identificar com elas, peço desculpas pelo uso de termo tão grosseiro. Não tenho a intenção de agredi-lo gratuitamente pois não sou melhor do que qualquer ser humano que divide comigo este planeta, mas na minha indignação essa é a palavra que me vem à mente. Contudo, reafirmo: só os trouxas vão atrás desses espertalhões. Sem contar os aprendizes da esperteza, é óbvio.

E os patrimônios pessoais desses vendilhões do templo estão sempre aumentando. São mansões, carrões, aviões e muitos outros “ões”. Proponho um exercício: procure saber quem eram essas pessoas há 20, 30 anos, e veja como elas vivem hoje.   

Seu séquito de bajuladores certamente dirá: “Aqui não se obriga as pessoas a doarem, elas dão espontaneamente, portanto não há crime algum, é tudo para a obra de Deus.” Eu não sei explicar a sensação que sinto nessas horas, mas algo me diz suavemente no meu interior: estão querendo te fazer de idiota. Parece até que eu estou ouvindo um deles falando com um ar de crítica e de sarcasmo, dando voltas na voz, empostando-a caricatamente, com toda empáfia que lhe é peculiar, e depois gritando suas condenações contra seus críticos. Pode não ser um crime sob a ótica legal, hipócritas! Todavia, tenho absoluta certeza de que afronta os princípios da ética e da moral de qualquer pessoa que já compreendeu o que significa não se locupletar com as fragilidades humanas, sejam elas espirituais ou materiais.

Imagino uma pessoa carente afetiva e financeiramente sendo bombardeada todos os dias, no rádio, na televisão, e também nos cultos, com uma mensagem que diz “para alcançar o sucesso e a bênção do Senhor, é preciso doar, doar, doar...” – há quem chame eufemisticamente de semear. Sua atitude é tão espontânea quanto a atitude daquele que precisa atravessar um rio e o único barco que existe é o de um homem que cobra um preço exorbitante para fazer a travessia. Para quem necessita atravessar o rio, há outra alternativa a não ser pagar o preço cobrado? É como disse um certo bispo, utilizando uma expressão muito popular, “ou dá ou desce.”

Uma coisa é você pedir em reuniões internas a colaboração financeira de seus irmãos para divulgar a fé que você abraça como a verdade, outra muito diferente é você manipular as pessoas todos os dias, em todos os programas, com promessas mirabolantes, do tipo: “Quanto mais você doar mais você receberá ou as bênçãos são proporcionais a quanto você estiver disposto a abrir o seu bolso.” É a chamada teologia do mercantilismo. Será que já não basta a teologia da prosperidade?

E o que é bastante sintomático é que todos eles utilizam a Bíblia para justificar suas atitudes repugnantes. Lamentavelmente, ao longo de muitos séculos a Bíblia tem sido utilizada para justificar muitas absurdidades. É sempre assim, pinçam o que lhes convém. E ainda acham que o porvir lhes será favorável. Se atentassem para a história bíblica do jovem rico (Mt. 19:16-24) não deveriam ter tanta certeza assim.

Há quem diga: “Deus é Rei e dono de toda a riqueza do universo; eu sou seu filho, portanto também tenho direito a essas riquezas.” Hipócrita! Riqueza digna é aquela que é fruto de um trabalho honesto e moral e que não provém do oportunismo e da exploração das fragilidades humanas. Nunca lestes Mt. 6:19-24? Ou esta teologia não se aplica mais aos nossos dias? Certamente só vale para hoje a prosperidade de Abraão ou do rei Davi!           

Quem pode fazer alguma coisa para impedir esses oportunistas? Não sei. O Poder Público? A Justiça? Também não sei. Quem sabe um dia o próprio povo o faça! Talvez um dia quando o povo atingir a maturidade do conhecimento e deixar de acreditar credulamente em tudo que se afirma nos púlpitos das igrejas, sem nenhum questionamento, alguns nomes se tornem apenas uma triste lembrança em um passado remoto.

Se eu fosse Deus, o faria! Lamentavelmente a única coisa que eu posso fazer é tentar alertar as pessoas através dessas palavras. Uma gota de água em um oceano, bem sei. Se apenas uma pessoa abrir a mente e passar a enxergar as torpezas que são cometidas em nome da fé, já me darei por satisfeito.

Eu não sou contra a prosperidade de ninguém, desde que seja obtida de forma honesta. O que eu critico é valer-se das fragilidades humanas para enriquecer, e é exatamente isto o que muitos pastores, bispos, missionários e apóstolos estão fazendo. 

Eu nunca soube que Jesus usasse o dinheiro dos discípulos para construir palacetes, ou para comprar carruagens luxuosas ou mesmo um cavalo puro sangue para usá-los como meios de transporte.

Para os seres abjetos que se aproveitam da ingenuidade de um povo sofrido, que se apega a qualquer coisa na esperança de resolver seus problemas – afetivos, financeiros, de saúde... –, o meu desejo é que eles se arrependam das suas práticas ignominiosas. Caso contrário, eu espero, com todo o ardor da minha alma, que no mais profundo do inferno, junto ao trono de Satanás, o rei das trevas, esteja reservado um lugar especial para todos eles. 


Saulo Alves de Oliveira