sexta-feira, 28 de agosto de 2015

“Guardará de todo o mal” quer dizer de “todo” o mal mesmo?

Por Saulo Alves de Oliveira

É muito comum no meio evangélico, pelo menos entre os pentecostais, alguém abrir a Bíblia aleatoriamente e tomar para si a primeira mensagem sobre a qual põe os olhos, que pode ser um só versículo ou um texto maior, sobretudo quando a pessoa passa por dificuldades. Detalhe: quando se trata de uma mensagem confortadora, obviamente. Quando não, bem... não vem ao caso.

As palavras podem ter sido proferidas por Davi, Moisés, Salomão, qualquer um dos profetas ou mesmo um dos apóstolos há milhares de anos em uma circunstância pessoal vivida por eles, mas ao abrir a Bíblia a pessoa diz: “Essa mensagem é para mim”, e se consola diante da adversidade, pois encontra ali forças para continuar a jornada da vida, às vezes tão difícil.

Eu sei que, para a maioria das pessoas, a vida é muito dura. Sabe lá o que é ver um filho pequeno sendo consumido por um câncer nos ossos ou no cérebro? Sabe lá o que é chegar ao fim do mês e não ter dinheiro para pagar as contas, nem ao menos para comprar comida para a família? Sabe lá o que é ter um marido ou filho alcoólatra ou viciado em drogas? Só mesmo quem vive ou já viveu tais situações pode avaliar com segurança a dimensão do sofrimento.

Eu diria que sob esse aspecto aquela mensagem é algo bom. Todavia, há algumas considerações a fazer.

O Salmo 121 é um caso típico.

Meu pai faleceu ano passado. Durante os dias de sua enfermidade, duas pessoas foram visitá-lo em ocasiões diferentes e leram o Salmo 121. Um belíssimo e reconfortante salmo.

As pessoas gostam desse salmo porque suas palavras podem trazer novo ânimo ou revigorar as forças do aflito. Para alguém que sofre uma grave doença ou vive momentos difíceis em sua vida, o Salmo 121 é um grande conforto e talvez ajude aquele que padece a enfrentar este “vale de lágrimas”, nas palavras de alguém que eu conheci há muitos anos quando se referia à luta do dia a dia.

O versículo 7 diz: “O Senhor te guardará de todo o mal; Ele guardará a tua vida.”

A grande questão, na minha forma de analisar certos textos bíblicos – e este não é o único que tem esta característica –, é a seguinte: este salmo tinha sua eficácia apenas para o povo de Israel ou ele é plenamente aplicável à vida dos crentes de hoje? 
 
Se a resposta à segunda parte da questão é “sim”, a outra pergunta inevitável é a seguinte: a palavra “todo” no versículo 7 tem realmente o sentido de completude, isto é, “todo” quer dizer guardar de tudo mesmo ou ainda dependerá da vontade soberana de Deus, ou seja, se Deus quiser?

Se a resposta é “depende da vontade de Deus”, eu entendo que o salmista deveria ter acrescentado “Se Ele, o Senhor, o quiser”. Assim, as pessoas não ficariam esperando algo que não é absoluto em seu sentido real.

E por que você faz esse questionamento? – alguém pode indagar.

Porque eu conheço pessoas, e certamente você também conhece, que ouviram essa mensagem e a tomaram para si, entretanto lamentavelmente sucumbiram ao mal, ou seja, o Senhor não os guardou de “todo” o mal.

quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Carta à minha Neta – O ano bissexto

Por Saulo Alves de Oliveira

Olá Papá,

Tudo bem? Como está na escola? E o caratê, está gostando?

A última vez que lhe escrevi você tinha apenas 5 aninhos. Hoje, você já está com 8 anos.

Desta vez vou tratar de um assunto simples, mas interessante.

Você sabe o que é ano bissexto? Acho que não, não é? Não é uma coisa muito complicada, mas penso que nem todo mundo sabe ou pelo menos não sabe porque foi criado o ano bissexto.

Você sabia que algumas vezes o mês de fevereiro tem 29 dias? É isso mesmo. Durante três anos consecutivos o mês de fevereiro tem 28 dias e no ano seguinte, ou seja, no quarto ano é acrescentado um dia ao mês de fevereiro. E isso tem tudo a ver com o ano bissexto.

No ano em que o mês de fevereiro tem 29 dias acontece o ano bissexto, isto é, em vez de 365 dias o ano tem 366 dias.

E o que finalmente é ano bissexto? Você já deve estar impaciente, hein? 

Nosso planeta Terra dá uma volta ao redor do Sol – a esse movimento chamamos de translação – a cada 365 dias e 6 horas, aproximadamente, e não apenas a cada 365 dias, como consideramos normalmente. Todos os anos, portanto, o ano civil tem uma defasagem de 6 horas a menos em relação ao ano solar, isto é, ao ano real. E essa diferença vai se acumulando ano após ano. 

Isso quer dizer que após 4 anos há uma diferença total de 24 horas (24 h = 4 x 6 h), ou seja, de um dia.

Por esse motivo, a cada 4 anos é feita uma correção e o ano passa a ter 366 dias, acrescentando-se um dia ao mês de fevereiro. Portanto, o ano bissexto é exatamente esse ano em que é feita a correção.

Há quem relacione o ano bissexto com as histórias de Josué e Ezequias, personagens bíblicos. Segundo a Bíblia, nos dias de Josué o Sol “parou” por quase um dia inteiro e no tempo de Ezequias o Sol “retroagiu” por cerca de 40 minutos, o que, somando-se, daria 24 horas. Se fosse esse o motivo, a correção teria sido feita apenas uma vez e não a cada 4 anos. Portanto, tais fatos nada tem a ver com o ano bissexto.

Além disso, os episódios ocorridos nos tempos de Josué e Ezequias estão em desacordo com as leis da Física. São uma questão de fé. Sobre isso conversaremos pessoalmente mais tarde.

Bom, estou quase terminando minha querida Papá, mas há um complicador em relação ao ano bissexto. E tal fato mostra também que as histórias daqueles personagens bíblicos nada tem a ver com essa questão.

Na realidade, o ano solar não tem exatamente a duração de 365 dias e 6 horas, mas sua duração é de 365 dias 5 horas 48 minutos e alguns segundos. Portanto, o ano bissexto é cerca de 11 minutos maior do que o ano solar. Então, ao longo dos séculos essa diferença também vai se acumulando. Por esse motivo, a cada 100 anos, ou seja, nos anos múltiplos de 100 é feita uma outra correção. Dessa forma, os anos múltiplos de 100 (1700, 1800, 1900, 2100...), e que não são múltiplos de 400 (1600, 2000...), não são bissextos.     

Acho melhor parar por aqui, não é Paola?

Até a próxima carta.

Um beijo do seu avô,

Saulo