Às vezes eu fico muito assustado
com a interpretação que algumas pessoas dão a certos fatos atribuindo-lhes a conotação
de supostos atos de Deus. E o pior é quando pessoas inteligentes e com boa
formação cultural, além do fato de serem religiosas, pensam assim. Então eu me
pergunto: por que é que a religião faz certos indivíduos aceitarem passivamente
determinadas crenças deturpadas ou visões tão absurdas? Se é correto atribuir
tais atos a Deus, seria correto perguntar: Deus comete injustiça?
Vamos a um caso específico.
Trata-se da imagem acima, que faz alusão ao Titanic.
A imagem mostra um navio no mar
sendo afundado por um enorme dedo, que, obviamente, representa Deus. Acredito
não deva ser difícil chegar a essa conclusão quando se lê as frases “Olha o que
acontece com homem que brinca com Deus. Cuidado! Com Deus não se brinca!”
Para aqueles que, eventualmente, não
lembram da história do Titanic, eu vou apresentar uma rápida descrição. A
tragédia aconteceu há pouco mais de cem anos.
O Titanic foi um grande navio
construído no início do século passado. Em 1912, por ocasião do seu lançamento,
era o maior navio de passageiros do mundo. Era dotado das mais avançadas
tecnologias da época e era tratado como “inafundável”.
Na noite de 14 de abril de 1912,
por ocasião da viagem inaugural entre a Inglaterra e Nova York, nos Estados
Unidos, o grande navio chocou-se com um “iceberg” no oceano Atlântico e já na
madrugada do dia 15, duas horas e quarenta minutos após, afundou.
O navio tinha 2.240 pessoas a
bordo, das quais 1.523 pereceram no naufrágio, que ficou conhecido como uma das
maiores catástrofes de todos os tempos.
Conta-se que o construtor daquele
navio de passageiros, o maior de sua época, no dia de lançá-lo ao mar, respondeu
da seguinte forma, a uma repórter que lhe perguntou a respeito da segurança do
navio: “Minha filha, nem Deus afunda este navio”.
A
partir daí algumas pessoas acreditam que Deus afundou o Titanic simplesmente para
castigar ou para dar uma lição ao seu construtor (sic). Que lição terrível, matar
1.523 pessoas para ensinar a uma só pessoa que de Deus não se zomba! Realmente
para mim é incompreensível, tanto quanto inaceitável, que seres humanos
racionais possam pensar dessa forma e se conformar com esta perturbadora ideia.
Então,
nós devemos mesmo acreditar que Deus se vingou do construtor do Titanic matando
centenas de pessoas afogadas? Se isso é verdade, não foi uma terrível injustiça?
Que culpa tinham aquelas pessoas? Como se pode punir alguém pelo pecado ou erro
de outrem? Isso está longe de qualquer critério de justiça.
Ao
fazer esses questionamentos, alguém me disse assim: “Não devemos tentar, pela
nossa própria concepção, decifrar os feitos de Deus!”
Essa
forma de pensar me parece própria de quem tem receio de questionar certos
aspectos relacionados a Deus porquanto tem medo de estar agredindo a sensibilidade
do Criador, sendo, por conseguinte, passível
de castigo. Eu sei, não poucas pessoas pensam assim.
Bom,
eu não tenho como tentar entender os feitos de Deus a não ser através das concepções
de justiça que o ser humano desenvolveu ao
longo de toda a sua história, e que vem evoluindo com o passar do tempo, pois
eu não sou um Deus, sou apenas um humano. E, consequentemente, não posso pensar
como Deus. Apesar disto, tal fato não anula a capacidade crítica que o meu cérebro
me proporciona. E, devo ressaltar, não é exclusividade minha.
Que
Deus é esse que não pode ser questionado racionalmente por mim ou por você,
seres racionais? Seria Deus um tirano ranzinza, atacado pela raiva, cheio de
rancor e vingativo que não suporta ouvir questionamentos das suas criaturas sem
castigá-las de imediato? Eu já pensei assim também. Felizmente há muito tempo
me livrei dessa concepção deturpada acerca de Deus.
A
mesma pessoa disse-me ainda: “Deus é soberano. Ele faz como bem quer, com quem
quer e quando quer!”
Até
matar, por vingança, ou torturar pessoas inocentes?
Infelizmente há pessoas que
pensam exatamente assim e não têm o menor pudor ao afirmá-lo. Certa vez eu ouvi
o Sr. John Piper, pastor americano, afirmar que Deus dá a vida a seres humanos
e a tira ao seu arbítrio, isto é, quando e da forma que Ele quiser, não
importando o grau de sofrimento ou de crueldade envolvidos na morte de qualquer
pessoa, do recém-nascido ao ancião.
Eu só
posso entender que pensar assim é dizer: Deus é um tirano absoluto que não está
nem aí para todo o sofrimento que pode causar a alguém, mesmo um ser inocente
como uma criança. Você acha que se uma criança é torturada dias ou meses a fio
com um câncer em seu cérebro é porque “Ele [Deus] faz como bem quer” esse
câncer? Há muitos outros exemplos terríveis.
Sinceramente,
isso me aflige e me deixa estupefato. Como é que seres humanos, em pleno uso de suas
faculdades mentais, podem conceber esse tipo de pensamento? Por que a religião
às vezes leva pessoas normais a aceitarem tranquilamente como normais ideias tão
absurdas? E o pior: apresentam todas as justificativas para defendê-las, e suas
consciências não lhes tocam.
Voltando
ao Titanic. Na realidade, o meu desejo é tentar fazer as pessoas entenderem que
Deus não teve nada a ver com o naufrágio do Titanic, caso contrário Ele é um
ser extremamente injusto. Deus não estava castigando o construtor do Titanic
por suas palavras, muito menos todas aquelas pessoas que morreram. O que
aconteceu foi simplesmente um acidente, como acontece todas os dias em todos os
lugares, sejam provocados por fenômenos naturais (tsunamis, terremotos,
vulcões, chuvas torrenciais etc) ou não (falhas em máquinas construídas pelo
homem ou falhas do próprio ser humano, como quedas de aviões, batidas de ônibus,
trens ou automóveis e acidentes diversos). Há ainda os lamentáveis “acidentes”
provocados por falhas no próprio caráter humano que fazem inúmeras vítimas,
tais como: guerras, brigas, desentendimentos entre pessoas ou entre nações etc.
Contudo,
não pretendo convencer ninguém de coisa alguma, pois não sou o dono da verdade.
Quero somente colocar alguns pontos de vista para reflexão, se as pessoas
julgarem que vale a pena.
Para
concluir, eu vejo apenas duas alternativas – bom, pode haver outras, entretanto
minha percepção não as alcança: ou o naufrágio do Titanic foi um simples
acidente ou Deus é injusto. Você fica com qual alternativa?
Saulo
Alves de Oliveira