domingo, 7 de agosto de 2011

O milagre no supermercado

Uma mulher subiu no púlpito de uma igreja e contou uma história interessante. Era casada e mãe de três filhos pequenos. Ela e o marido estiveram desempregados, por conseguinte toda a família passara por sérias dificuldades tempos atrás.

Certo dia, contou ela, no auge do desespero uma voz lhe disse: “Vai ao supermercado fazer compras”. “Como fazer compras se eu não tenho dinheiro?”, questionou-se. Entretanto obedeceu àquela voz interior.

Chegando ao supermercado dirigiu-se às gôndolas e foi enchendo o carrinho. Colocou de tudo, de alimentos a produtos de limpeza e de higiene pessoal. Carrinho lotado, encaminhou-se para a fila do caixa de número sete. Enquanto aguardava na fila, pensava consigo mesma: “Como eu vou pagar se não tenho dinheiro?”, entretanto confortava-se: “O Senhor proverá”. 

Chegou a sua vez. Colocou todos os produtos na esteira do caixa que começou a passá-los no leitor ótico. Quando já tinha passado mais da metade das compras, ouviu-se uma voz no sistema de som do supermercado: “Atenção senhores clientes! Numa promoção inédita, acaba de ser sorteado o cliente que está sendo atendido neste exato momento no caixa de número sete, o qual levará suas compras sem desembolsar sequer um centavo”.

Neste momento em que contava a história a mulher chorou emocionada e exclamou: “Foi um milagre!”. Todos os presentes à reunião, menos um jovem, levantaram as vozes e, rejubilando-se efusivamente, concordaram: “Foi um milagre”. Terminada a reunião, todos, menos o jovem, foram para suas casas alegres e certos de que tinham acabado de ouvir a história de um verdadeiro milagre. Ninguém, exceto aquele jovem, pensou em indagá-la acerca de outros possíveis detalhes do suposto milagre.

Dias depois o jovem encontrou-se com a mulher e lhe fez o seguinte questionamento: “Eu ouvi a senhora falar acerca do milagre no supermercado, entretanto – desculpe se pareço inconveniente –, eu gostaria de saber se não há algum outro pormenor que a senhora deixou de relatar”. “Bem”, disse a mulher, “na realidade a história teve outros detalhes, mas, para não torná-la tão longa, e por julgá-los sem importância, preferi omiti-los”. E os contou ao jovem.

“Quando cheguei ao supermercado, primeiro eu me dirigi ao Gerente e lhe contei a minha história. Disse-lhe que eu e meu marido estávamos desempregados e que por esse motivo estávamos vivendo sérias privações juntamente com nossos filhos pequenos. Mal tínhamos água e farinha em casa para comer. Então perguntei ao Gerente se ele poderia nos doar algo para nossos filhos ou, pelo menos, nos vender fiado alguns alimentos”.  Ela continuou relatando que o Gerente ouviu toda a história em silêncio, porém ao final disse-lhe que nada poderia fazer por ela. “Agradeci pela atenção e saí da sala da gerência”, afirmou.

Desesperada e chorando muito a mulher resolveu dar ouvidos à voz interior que lhe dissera: “Vai ao supermercado fazer compras”, pois, conforme pensou, “o Senhor proverá”. A partir daí a história continua no momento em que ela se dirigiu às gôndolas do supermercado e encheu o carrinho.

Entretanto, algo aconteceu paralelamente. A sala do Gerente ficava numa posição estratégica e de lá ele conseguia visualizar toda a loja. Ele viu a mulher sair desolada da sua sala e, com o olhar, a acompanhou entre as prateleiras do supermercado a todo momento enxugando as lágrimas. Então, sensibilizado com o seu desespero – e numa atitude altruísta – decidiu ajudá-la. A partir deste momento já se sabe o que aconteceu.

O que é um milagre? Milagre é a suspensão momentânea das leis da natureza, ou seja, é interferir diretamente no curso das leis naturais. Exemplo: se alguém jogar uma pedra para o alto esta cairá inevitavelmente de volta à terra atraída pela força gravitacional que age sobre todos os corpos. Entretanto, se a pedra ficar flutuando no ar, trata-se de uma violação da Lei da Gravitação Universal e isso, portanto, seria um milagre. Talvez um dia se consiga essa façanha, mas também com o conhecimento de leis naturais que ainda não foram descobertas.

Não crítico o beneficiário de um “milagre” por julgá-lo um milagre. Quem está se afogando apega-se a qualquer tábua de salvação. Entretanto analiso o fato sob uma ótica crítica e de independência.

No episódio relatado acima não houve milagre algum, simplesmente um ser humano dotado de grandeza de caráter e elevado altruísmo resolveu ajudar outros seres humanos que passavam por sérias dificuldades. Exemplos assim não são raros e é até comum pessoas ajudarem outras pessoas carentes mesmo não as conhecendo. É algo digno de louvor, mas não se enquadra na categoria de milagres.

Como é fácil enganar pessoas crédulas. Dos dentes de ouro do passado, passando pela prática de derrubar pessoas para curá-las, às promessas de muito sucesso àqueles que doam dinheiro, muitas são as táticas dos oportunistas. Portanto, devemos estar sempre atentos.

Uma das formas de descobrir a verdade é exercitar um pouco de ceticismo. Algumas regrinhas são fundamentais. Primeiro, duvide sempre de histórias fantasiosas, mesmo contadas por pessoas de reconhecida autoridade. Em segundo lugar, procure saber todos os detalhes daquilo que lhe contam. Muitas vezes quem conta algo não mente, porém omite informações importantes, às vezes por inocência e às vezes propositalmente, para parecer mais espiritual do que os outros ou realmente para enganar.

Na realidade essa é uma história de ficção, mas, para quem não entendeu o seu objetivo,  o que posso dizer é que – embora me impondo certos limites – ela tem muito a ver com tantas histórias que são contadas nos púlpitos das igrejas, nas rádios e na televisão.

No entanto, se você quiser continuar acreditando que é um milagre...

Saulo Alves de Oliveira