sábado, 22 de março de 2014

Quanto ingenuidade!

Quando eu era criança e depois na minha juventude, acho que por conta dos ensinamentos que recebi dos meus pais e na minha igreja, eu pensava que todos os crentes – ou evangélicos – eram pessoas diferentes das outras, dos lá do “mundo”, como é comum os crentes chamarem os não crentes.

(Quando a palavra crente é apenas sinônimo de evangélico, tudo bem. Não vejo nada demais. Porém, quando crente é antônimo dos lá do “mundo”, e este último pronunciado com uma entonação arrogante e pejorativa...)  

Eu pensava que ser crente era sinônimo de amar o próximo, não mentir, defender a verdade a todo custo, não fraudar, não se vingar, não difamar, não vender a consciência, não comprar consciência, não acusar sem provas, não buscar os seus próprios interesses, não roubar e muitas outras coisas nesse sentido do bom caráter.

Eu pensava que os pastores, aqueles “homens santos”, conversavam diretamente com Deus e tudo decidiam ouvindo Deus lhes falar ao ouvido. É isso mesmo. É verdade. Acreditem!

Quanto ingenuidade! (Podem exclamar, amigos).

Hoje, lamentavelmente eu descobri que, como em qualquer ajuntamento social, há crentes bons e crentes maus. Há crentes que mentem, fraudam, vingam-se, difamam sem o menor escrúpulo, vendem ou compram consciências, roubam e fazem tudo o mais que qualquer um lá do “mundo” faz.

Eu descobri ainda que muitas decisões são tomadas segundo os interesses políticos e pessoais de quem está liderando. E o que é mais triste: divulgam que aquela é a vontade de Deus. E os estultos dizem sim.

A grande diferença é que hoje nem estes nem aqueles fazem mais a minha cabeça.        

Se neste momento passa pela sua mente a parábola do trigo e do joio, saiba que não cabe aqui, pois não estou comparando trigo e joio, mas trigo e uma erva daninha conhecida popularmente como carrapicho.

Saulo Alves de Oliveira

terça-feira, 11 de março de 2014

Por que Deus mandou matar?

Uma amiga me enviou um vídeo que trata de uma questão muito polêmica: “Por que Deus mandou matar?” O apresentador mostra “evidências” que, segundo seu entendimento, justificam as matanças com requintes de crueldade, os assassinatos e os genocídios na Bíblia.

Não sei se a minha amiga concorda com todas as justificativas apresentadas pelo comentarista do vídeo, porém eu penso que ela tem um senso moral acima da média, pois sua atitude certamente demonstra que ela se preocupa e reflete acerca de questões contidas na Bíblia tão complicadas e difíceis de “digerir”.

Assista-o, vale a pena, com certeza ajudará você a consolidar sua opinião acerca desse tema, quer seja favorável, quer seja contrária. Clique aqui para assisti-lo. 

Quanto a este beócio opinador... bem, o que posso dizer? Lamentavelmente, nada do que o comentarista argumentou me fez mudar de opinião.

Falar em questão cultural ou que Israel estava retomando suas terras não justifica o assassinato e o extermínio de inocentes ou de povos inteiros, pois não estamos falando de decisões tomadas por seres humanos, mas pelo próprio Deus, que certamente não está limitado pela cultura humana.

Deus tem ou não o poder de estabelecer padrões morais eternos? 

Se havia alguma justificativa, se é que havia, para mandar matar os adultos, nada justifica o assassinato e o extermínio de crianças e animais. Por que matar crianças e animais? Qual o pecado deles? Se Deus é onipotente, ou seja, tudo pode, Ele não poderia ter sido seletivo com os maus?

Deus é soberano, alegam alguns. Sim, mas Ele pode passar por cima da sua própria Palavra? Diz-nos a Bíblia: “A alma que pecar essa morrerá” – Ez. 18.20 e “Não se farão morrer os pais pelos filhos, nem os filhos pelos pais; cada qual morrerá pelo seu próprio pecado” – Dt. 24.16. Aqui, no entanto, há um sério problema, pois em Ex. 20.5 o Senhor diz: “...Sou Deus zeloso, que visito a iniquidade dos pais nos filhos até a terceira e quarta geração daqueles que me odeiam...”, o que parece contradizer Dt. 24.16. Todavia, essa é uma outra questão para outro momento.  

O problema é sempre este. Para qualquer dificuldade bíblica, as pessoas sempre encontram uma forma de justificar o injustificável. Por que não admitir logo como o pastor americano John Piper, que diz que Deus mata do jeito que Ele quiser, pois não deve satisfação a ninguém? Ele mata com uma bala, com uma explosão – fazendo a pessoa “voar” em pedaços pelos ares num atentado terrorista –, com uma grave doença ou ainda, como no passado, usando o exército de Israel como agente executor do seu desígnio.

Essa teologia também é terrível, portanto tenho uma enorme dificuldade de me relacionar com o Deus de John Piper, apesar de julgar que sua opinião é mais compatível com a realidade e com a Bíblia.                

Citar o caso de Sodoma e Gomorra como exemplo de cidades iníquas para justificar a destruição daqueles povos, em nada facilita a questão, pois “não havia pelo menos 10 crianças – seres justos, ou não? – naquelas localidades que assim evitassem sua destruição, como prometeu o Senhor?”

Ao final do vídeo, o comentarista cita o complicadíssimo caso de I Sm. 15.3: “Vai, pois, agora e fere a Amaleque, e o destrói totalmente com tudo o que tiver; não o poupes, porém matarás homens e mulheres, meninos e crianças de peito, bois e ovelhas, camelos e jumentos”. E, para contornar a dificuldade, ele levanta a hipótese de linguagem hiperbólica, isto é, não era bem aquilo que o Senhor ordenara. Um verdadeiro exercício de contorcionismo mental para justificar algo que já está evidente.

Na realidade, o texto é claríssimo. Leia todo o capítulo de I Sm. 15 e você verá inclusive que Saul foi rejeitado como rei de Israel porque não cumpriu toda a ordem do Senhor, pois preservou o melhor do rebanho. Deus mandou destruir tudo, tudo mesmo, inclusive as crianças e os recém-nascidos (sic).

Sei, no entanto, que a questão é muito difícil e polêmica, pois está na Bíblia, a regra de fé e prática cristã, e conflita com os princípios morais que nós julgamos aceitáveis como seres humanos conscientes e por isso procuramos uma justificativa. Todavia, será que há?

Eu precisei de muitos anos para digerir isso e muito mais. Entretanto, o mais importante é estar em paz consigo mesmo e com a consciência. E eu estou, não aceitando justificativas para toda essa inominável carnificina.

E paz é o que eu desejo também a você que perde um pouco do seu tempo lendo este texto de um aprendiz de aprendiz na arte da escrita.

Ademais, não deixe de assistir ao vídeo “Por que Deus mandou matar?” e tirar suas próprias conclusões.

Saulo Alves de Oliveira