sexta-feira, 28 de fevereiro de 2020

Cachaça de cinco mil dólares?!!

Por Saulo Alves de Oliveira

Eu ouvi o relato abaixo de um jovem advogado brasileiro que mora na Europa. Brilhante e muito inteligente, ele tem um canal no Facebook e um site nos quais faz comentários políticos e discussões com diversos especialistas sobre política nacional, economia, geopolítica, etc. Eu já o acompanho há mais de dois anos.

A um tempo atrás ele contou uma história interessante, porém, sob o ponto de vista daqueles que sonham e almejam um país livre da velha prática politiqueira do “toma-lá-dá-cá”, muito preocupante, sobretudo pela ex-estrela envolvida. 

Certo dia ele manteve contato telefônico com uma figura que já tivera grande destaque na política nacional, tendo ocupado alguns dos mais altos cargos da República. Devido a alguns percalços, hoje essa pessoa está meio apagada no cenário político nacional, mas parece que por trás dos bastidores continua muito ativa e influente. Para facilitar o desenrolar deste comentário vou chamá-la de Seu Dir e o advogado de Roayam.

Quando o jovem advogado atendeu o telefone, Seu Dir exclamou: “Ah, você é o Roayam? Eu queria muito conhecê-lo. Sabe o que eu estou fazendo neste momento? Estou tomando uma cachaça de cinco mil dólares.” Do restante da conversa, não me lembro e, para o objetivo desse pequeno texto, é de pouca importância.

Tão fora de propósito e estranha parecia a apresentação do Seu Dir – aparentemente, é claro – que Roayam ficou sem entender aquele início de conversa, dado que não é um apreciador dessa bebida tipicamente brasileira – a cachaça –, nem de um real e muito menos de cinco mil dólares (sic).

No entanto o que mais impactou Roayam foi o fato do Seu Dir dar-se o luxo de ostentar, desavergonhadamente, uma prática tão supérflua, brindando a si próprio com uma bebida tão cara e, o pior, incompatível com sua suposta vida de lutas, pelo menos no passado, para transformar as brutais desigualdades sociais do sofrido e injustiçado povo brasileiro. Bom, essa sempre foi a proposta do seu partido político. Convém ressaltar que eu sempre acreditei.

Tempos depois, Roayam conversou com alguém, se não me engano ligado ao partido do Seu Dir, e ouviu a seguinte observação: “Deixe de ser ingênuo Roayam, não existe cachaça de cinco mil dólares. A cachaça mais cara custa cerca de dois mil reais. Esse tipo de abordagem é uma espécie de código para tentar descobrir qual é o preço do interlocutor. Pessoas de quase todos os partidos fazem uso dessa prática”.  

Seria uma forma inteligente (sic) de tentar cooptá-lo sem ser muito explícito ou tão agressivo?! Talvez! Seria mais ou menos como perguntar: “Seu preço é cinco mil dólares para vir para o nosso lado?” Foi o que deixou claro o segundo interlocutor do Roayam.

Na realidade, disse Roayam, “Eu não sei se ele estava simplesmente esnobando, o que é incompatível com alguém que se propõe a mudar a realidade social do Brasil ou se realmente estava me ‘cantando’, isto é, me oferecendo uma propina (?) para compactuar com sua forma de fazer política e deixar de dizer algumas verdades inconvenientes no contexto político/histórico que vive hoje o Brasil”.

Os diálogos ou comentários acima não são transcrições literais do que ouvi, porém representam exatamente o sentido do que relatou Roayam. A cachaça de cinco mil dólares, todavia, é literal.

O mais triste nisso tudo, e profundamente decepcionante, até mesmo desanimador, é que o Seu Dir é um importante quadro, talvez dos mais importantes, por acaso do mais influente partido da esquerda nacional.

Ponho-me a pensar.

Convido-o a fazer o mesmo.