sábado, 31 de dezembro de 2011

Ciência e esoterismo

Algumas pessoas criticam a ciência porque esta não tem compromissos com suas crenças e com sua fé, e por isso muitos até a satanizam. A ciência, entretanto, não tem nada a ver com o Diabo, porquanto uma grande parcela dos cientistas, talvez a maioria, não acredita na existência de Deus como também não acredita sequer na existência de Lúcifer.

A ciência trabalha para descobrir a verdade acerca das leis que regem o nosso Universo, independentemente dessas leis confirmarem ou não os dogmas de quaisquer religiões. Exemplo: a ciência não visa confirmar a história de Adão e Eva do Gênesis, porém seu  objetivo é descobrir a origem da vida em nosso planeta e como surgiram todos os seres vivos, inclusive o ser humano.

Para dar uma pequena ideia de como trabalha o cientista, reproduzo a seguir um pequeno texto extraído do livro “Retalhos cósmicos”, de Marcelo Gleiser, físico e astrônomo brasileiro. Chamo a atenção para os trechos sublinhados. O texto tem o título “Ciência e esoterismo”:
"A astrologia é muito mais popular do que a astronomia. Sem dúvida, um número muito maior de pessoas abre o jornal ou uma revista para consultar uma coluna astrológica do que para ler uma coluna sobre astronomia. E a astrologia não está sozinha; numerologia, quiromancia, cartas de tarô, búzios etc. [e algumas estripulias religiosas, inclusive de alguns charlatães evangélicos (esse acréscimo é meu)] também são extremamente populares.

Como físico, não cabe a mim tentar explicar o porquê dessa irresistível atração pelo que obviamente está além do que chamamos de fenômenos naturais. Mas posso ao menos oferecer uma conjectura. O fascínio pelo esotérico vem justamente de seu aspecto pessoal, privado; você paga a um profissional com conhecimento ou “poderes” esotéricos para que ele fale sobre você, sua vida, seus problemas, seu futuro...

Por trás desse fascínio pelo “saber” esotérico encontramos nosso próprio desejo de nos situarmos melhor emocional ou profissionalmente em nossas vidas. Nesse sentido, a atração pelo esoterismo força as pessoas a uma autoreflexão que pode até ser muito importante como veículo de autoconhecimento. Segundo esse ponto de vista, é nossa própria psique, talvez catalisada mas não controlada por poderes ocultos ou sobrenaturais, que nos ajuda a melhorar nossa existência.

Mas como físico cabe a mim fazer o  papel do chato e argumentar contra a crença na existência desses fenômenos no mundo natural. E isso não é porque sou “bitolado” ou “inflexível”. Muito pelo contrário, qualquer cientista ficaria imediatamente fascinado pela descoberta de um fenômeno novo, por mais estranho que ele seja. Faz parte de nossa profissão justamente manter a cabeça aberta para o inesperado.

O problema com o esoterismo é que não temos nenhuma prova concreta, científica, de que esses fenômenos realmente ocorrem. As “provas” que foram oferecidas até o momento – fotos, depoimentos pessoais, sessões demonstrativas e compilações estatísticas de dados – misteriosamente se recusam a sobreviver quando testadas no laboratório sob o escrutínio do cientista ou após uma análise quantitativa mais detalhada.

Uma das grandes armas da ciência contra o charlatanismo é justamente a possibilidade de repetirmos certo experimento quantas vezes desejarmos. Os cientistas não precisam “acreditar” nos resultados de outros cientistas; basta repetir o experimento em seu próprio laboratório sob condições idênticas, e os mesmos resultados devem ser encontrados. Caso eles não sejam encontrados, das duas uma: ou você errou na repetição do experimento e seu colega está de fato correto, ou seu colega errou e seus resultados devem ser abandonados.

Eis aqui um exemplo, a “descoberta” da fusão fria, a produção de energia a partir da fusão de núcleos atômicos a temperaturas normais. O surpreendente é que, segundo a física convencional, o processo de fusão nuclear ocorre a temperaturas e pressões altíssimas, por exemplo, no interior do Sol ou na infância do Universo. Em 1989, Stanley Pons e Martin Fleischmann, dois cientistas de renome, chocaram a comunidade científica internacional ao anunciarem a descoberta da fusão nuclear à temperatura ambiente.

(Essa ilustração não faz parte do livro)
O trítio e o deutério, dois isótopos do hidrogênio, se fundem no interior das estrelas para produzir o hélio. 

Sendo um resultado capaz de revolucionar a produção mundial de energia, vários grupos imediatamente tentaram reproduzir os achados de Pons e Fleischmann. Após alguns alarmes falsos, ficou claro que fusão nuclear à temperatura ambiente é impossível. Os resultados de Pons e Fleischmann, não podendo ser reproduzidos, tiveram de ser abandonados.

Essa história tem várias morais. Uma delas é que os cientistas também podem cair no conto do vigário. Mas só por algum tempo! Descobertas que não podem ser reproduzidas são descartadas. Outra moral é que os cientistas devem ser mais cautelosos com a divulgação de suas descobertas pela mídia. Ainda mais relevante para a nossa discussão, os cientistas não são a priori fechados a fenômenos “estranhos”, apenas não aceitam fenômenos que se recusam a ser reconfirmados no laboratório.

Seria realmente fascinante se houvesse uma força desconhecida que pudesse influenciar nosso comportamento (ou pelo menos indicar tendências) a partir de um arranjo cósmico em que nós, como indivíduos, participássemos ativamente, uma espécie de astronomia personalizada.

Mas, para mim, mais fascinante ainda é seguir os passos de outros cientistas e dedicar toda uma vida ao estudo dos fenômenos naturais, armado apenas com a inspiração e razão. Ao compreendermos um pouco mais sobre o mundo à nossa volta, estaremos, também, compreendendo um pouco mais sobre nós mesmos e sobre nosso lugar neste vasto e misterioso Universo."
Saulo Alves de Oliveira

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Conversa nas alturas

Era uma noite de clima bastante agradável. Eu estava lendo um livro – acho que era “Mundos Paralelos”, de Michio Kaku – e, num repente, me vi a bordo de um avião em um voo de São Paulo para o Rio de Janeiro. Havia muitas poltronas vagas, de modo que dava para ouvir razoavelmente bem a conversa de quem estava muito próximo. Como eu viajava sozinho e os dois assentos ao meu lado estavam desocupados, fiquei bem à vontade. 

Assim que o avião decolou, comecei a olhar pela janela e vi os prédios se apequenarem lá embaixo e as primeiras nuvens começaram a embaçar a visão da cidade.

Nos lugares logo atrás da minha poltrona, havia dois senhores que iniciaram uma conversa tão logo o avião levantou voo. Não vi os seus rostos quando eles entraram, no entanto o tema me interessou, então agucei a audição. Vou chamá-los de João e José apenas para facilitar a compreensão. A partir do momento em que comecei a prestar atenção, a conversa era mais ou menos assim:

João: Alguns críticos andam dizendo por aí que nós nos aproveitamos da ingenuidade das pessoas para aumentarmos nossos patrimônios pessoais. Como tudo na vida tem certo grau de subjetividade, algumas das nossas práticas podem até ser consideradas não éticas ou não morais, mas com certeza não são ilegais. Não estamos roubando, apenas pedimos ofertas voluntárias para expansão do reino de Deus na terra e, como está escrito, “não atarás a boca do boi quando estiver debulhando o grão.” Não é verdade?

José: É isso mesmo! É a mais pura verdade. Se não é assim, por que as autoridades não nos têm molestado? Se não há dolo e nós encontramos “voluntários (essa palavra foi dita com certa ênfase) que doam dinheiro para nossas Igrejas, mesmo que, algumas vezes, à custa do próprio sustento, eu acho que nós devemos continuar pedindo. Afinal de contas, é tudo para a obra!

João: Veja bem, qual tem sido a nossa estratégia lá? Nós simplesmente prometemos que... (ininteligível) dará sucesso, emprego, casa, carro, empresa e tudo o mais àqueles que se dispõem a “contribuir voluntariamente” (nesse momento eu percebi um certo ar de riso na voz) e muitos dão seus testemunhos. É claro que antes nosso pessoal conversa com as pessoas para ajustar os detalhes. Agora, dízimo é outra coisa, é sagrado. Lá a maioria esmagadora entrega o dízimo, até mesmo o pessoal do bolsa família.

José: Sabe de uma coisa, estive pensando outro dia... na verdade eu acho que o dízimo é muito pouco. É coisa do passado, ainda do tempo do Velho Testamento. Apenas uma vez o dízimo é ensinado no Novo Testamento – e de um modo meio transverso –, está em Mt. 23:23, e não para a Igreja, mas para os escribas e fariseus, praticantes da Lei Mosaica. Por que não inverter as coisas? Eu acho que nós poderíamos pensar numa estratégia para convencer as pessoas a entregarem paulatinamente dois dízimos, depois três dízimos até chegar a 90% e assim elas passariam a viver apenas com o dízimo.

João: Você quer dizer: “Viver com o dízimo e entregar 90% para o... (ininteligível)?” É uma boa ideia! O problema é colocá-la em prática. Acho que nós poderíamos chamar de novízimo (risos). Contam que no passado um rico americano chamado William Colgate chegou a doar até 50% dos seus lucros para a Igreja.

José: Afinal a Igreja precisa crescer e o patrimônio dos seus líderes também. Os fiéis precisam ver que, se o homem de Deus alcançou o sucesso, eles também podem alcançá-lo. Lá, eu tenho seguido o seu exemplo. Dou murro no púlpito, jogo a Bíblia no chão, pulo, grito, faço e aconteço. As pessoas precisam ver que a gente tem coragem de desafiar o Senhor e reivindicar os nossos direitos como filhos de Deus. Assim, elas também podem. 

João: Veja bem, ninguém é obrigado a dar, não é verdade? As pessoas doam voluntariamente porque são convencidas pelo... (me distraí por alguns segundos vendo um outro avião passar ao longe). Então é legal! Ora bolas!

José: Sabe de uma coisa, às vezes eu fico até meio constrangido ao ver aquelas velhinhas trazendo ofertas obtidas com tanto sacrifício. Será que os fiéis têm a percepção de que a gente vive com alguma ostentação?

João: Acho que alguns sim, mas... dessa forma você está exagerando... ostentação!... não. É só uma boa vida. Ah, tudo bem! Eles sabem que tudo é para a obra, por isso nós temos de pedir mesmo. Se um ou dois não dão, oito dão e os críticos que se... (nesse momento houve um sinal sonoro que chamou minha atenção e o piloto avisou que íamos passar por uma pequena turbulência e eu não compreendi o restante da frase). Será que as pessoas não percebem o quanto nós trabalhamos! São diversas cruzadas todo mês, muitos programas de televisão, artigos para jornais, livros para escrever, muitas viagens pelo mundo para expandir o Evangelho e cuidar das ovelhas. Sem contar a infinidade de reuniões com assessores. É tudo muito cansativo! Além disso, tem a estafante administração dos nossos negócios.

José: É isso mesmo. Veja bem... no meu caso... eu tenho viajando tanto pelo Brasil nos últimos dias! Tenho me sentido tão cansado... estamos em plena expansão pelo país. Toda semana é uma inauguração de um novo templo. São duas pregações quase toda dia. É um verdadeiro chá de espera em salas de aeroportos. Já estou abusado de tanto entrar em salão de embarque com todas aquelas pessoas olhando pra mim como se eu fosse um extraterrestre. E ainda tem gente que se aproxima para “bater um papinho” ou para fazer cada pergunta tola e já tão batida, tipo: “Os dias da criação são dias de 24 horas ou são bilhões de anos?” Como se isso tivesse alguma relevância. O que interessa é que Deus criou todas as coisas, oh! neófito!, seja em 6 dias de 24 horas ou em milhões ou mesmo bilhões de anos! (disse estas palavras como quem estava bastante irritado).

João: É por isso que a gente tem de viver e morar confortavelmente e andar sempre bem vestido, não é qualquer ternozinho que satisfaz, não é mesmo? (risos). Eu só uso alta costura e gravatas de seda italianas, sapatos também só italianos, e da região da Toscana. Afinal, somos representantes da Igreja, não vamos andar por aí como um pastorzinho qualquer de interior (percebi um certo deboche no final da frase). No começo, há trinta e cinco anos, era tudo muito difícil. Mas, naquela época,  era somente por amor e fé.

José: Sabe de uma coisa: “Você tem razão mesmo.” Aqui pra nós (baixou a voz e eu tive de fazer um esforço enorme para entender): “Depois um bichinho chamado cobiça foi tomando conta da gente e a gente querendo sempre mais.”

João: Você conhece o...? (não entendi o nome) Pessoalmente, é um cara que impressiona mesmo. Seu carisma é de fato incomum. Tem um poder de persuasão como eu nunca tinha visto. Já estive com ele duas ou três vezes.    

José: Claro que o conheço. Li vários dos seus livros. Eu até me espelho nele há algum tempo. Só não gosto muito daquele negócio dele derrubar as pessoas. Até tentei imitá-lo, porém não deu certo.

João: Mas o negócio é sério mesmo! Eu o acompanhava em uma de suas cruzadas em Dallas, no Texas, quando ele se virou para mim e gesticulou com o braço na minha direção e eu caí imediatamente. Depois estive revendo as imagens e achei a minha queda meio esquisita, parecia até que eu tinha sofrido um choque elétrico, entretanto no momento a sensação é impressionante, é como se você estivesse flutuando no ar e caísse suavemente sobre um colchão extremamente confortável. Bom, porém o eu quero ressaltar na verdade é a reposta que ele deu em uma entrevista para um documentário chamado “Milagres”, exibido no canal Discovery a tempos atrás. Quando lhe questionaram sobre o fato dos recursos da maioria dos pregadores provirem de pessoas humildes – e muitas em sérias dificuldades financeiras – em contraste com a opulência demonstrada por esses pregadores, ele respondeu:
"Embora eu receba um bom salário e more com conforto, embora eu voe em um avião particular, quero lhe explicar por que faço assim. Se eu não voasse em um avião particular, logo estaria esgotado. Então é um benefício, vou durar mais tempo. Serei mais produtivo para o reino de Deus... Não vejo nenhum problema no modo como angariamos os fundos. A maioria só doa porque acha que Deus os está levando a doar, não porque alguém pediu."
José: Eu não te falei que me espelho nele! Mas, mudando de assunto: “Você ainda mora naquele casarão alugado?”

João: Realmente eu estou percebendo que nós não conversávamos há muito tempo. Que casarão alugado, rapaz! Eu comprei um apartamento de cobertura de 1.200,00 m² num dos melhores edifícios do Leblon, no Rio de Janeiro. Na realidade, eu também comprei o casarão, porém ele agora serve como sede da minha editora e gravadora. E você?

José: Prefiro São Paulo. É a locomotiva do Brasil. Moro em Higienópolis. Meu apartamento não chega a tanto, mas também é de cobertura e beira mais ou menos os 600,00 m², com quatro 4 vagas de garagem.

João: Ah, você sabia que eu estou concluindo uma mansão em Campos do Jordão? É para descansar nos finais de semana com a família e com o meu staff de assessores mais próximos. Quando estou no Brasil, logicamente (fez questão de ressaltar). Afinal, nossas atividades são realmente muito cansativas. Piscina, campinho de futebol, churrasqueira e umas coisinhas mais. Tem até quadra de tênis, mas é para a família e os amigos. Gosto muito de jogar tênis, porém faz algum tempo que estou com uma contratura no braço direito que me impede de executar o... (não entendi direito, todavia, como falava em jogar tênis, acho que a palavra foi “forehand”).

José: Você não quer que eu faça uma “oração forte” pelo seu braço agora mesmo? Casa de ferreiro, espeto de pau, hein? (risos) Eu comprei recentemente um chalezinho de 300,00 m² em Gramado. Também é uma boa opção. Dizem que lá o Natal é maravilhoso (parece que nesse momento o João questionou a pequena área do imóvel). Está achando pouco 300,00 m²? Tudo bem, eu ainda não cheguei ao seu patamar.

João: É só fazer aquela campanha dos R$ 5,00 todo dia no cofrinho do... (não entendi a palavra).  Você sabe como é, né? No final do mês, a pessoa traz o cofrinho cheio e joga na parede da vitória e quebra todas as maldições.

José: Sei, sei, mas... prefiro ir com calma. Eu ouvi um boato que você tem apartamento nas principais cidades do mundo, Paris, Londres, Nova York... É verdade?

João: Não, essa daí é intriga do... (nesse momento a comissária ofereceu-me um refrigerante e eu não entendi o restante da frase). Eu prefiro ficar hospedado nos melhores hotéis das cidades quando em visita a outros países, afinal todos têm suíte presidencial, e tudo é por conta da Igreja. A não ser que fixe residência lá fora, como é o meu caso, pois venho ao Brasil uma vez ou outra apenas para conferir como as coisas estão e para o povo não me esquecer. Mas, neste caso, eu prefiro casa. Na realidade, eu moro realmente nos Estados Unidos. Tenho até uma bela casa lá, se é que se pode chamar simplesmente de casa um imóvel com 1.800,00 m² de área construída. Fica no famoso bairro de... (uma criança passou correndo e eu me distraí).     

José: Olha, rapaz, você é forte mesmo, hein?

João: Como a Igreja já está consolidado no Brasil, chegou o momento de conquistarmos também a terra do Tio Sam. Além disso, os Estados Unidos são uma ótima opção para comandar de lá a expansão da Igreja em todo o mundo.

José: Sabe de uma coisa, quase esqueci que eu só andava de taxi quando era pastor daquela igrejinha no subúrbio. Quando não tinha dinheiro, era de ônibus mesmo. Hoje, meu carro é top de linha, com motorista exclusivo. Às vezes, eu ainda fico meio constrangido quando um fiel chega perto de mim e diz que andou a pé o mês todo para economizar as passagens e entregar para a Igreja. Dia desses, eu estava parado num sinal na Av. Paulista quando parou um carrão preto ao meu lado. Olhei e te vi sentado lá dentro. Até acenei porém você não me viu.

João: No Rio ou São Paulo eu só me desloco de helicóptero. Tenho um em cada cidade à minha disposição. Quando não dá para usá-los, eu vou de carro, porém só quando não dá mesmo. O trânsito no Brasil está insuportável. É uma enorme perda de tempo. Mas só ando de importado, blindado, e com segurança. Gosto muito daquele modelo top de linha da...(ininteligível). Táxi?, não quero nem ouvir falar!              

José: Blindado? Segurança? E o anjo do Senhor que acampa ao redor dos que o temem e os livra? Há pouco tempo eu vi você pregando acerca disso na TV!

João: Olha, caro amigo, eu ainda creio na Palavra, no entanto Rio e São Paulo não estão para brincadeira. Você sabe melhor do que eu, pois acompanha as notícias diariamente aqui no Brasil. Aliás, é em todo lugar, até no chamado primeiro mundo. Eu prefiro não arriscar. Lembra daquele antigo ditado que diz: “Seguro morreu de velho?”

José: Eu te falei que estava cansado de aeroporto, não foi? Por falar nisso, eu estou quase fechando a compra de um jatinho. Não é novo, mas está bem conservado e dá para viajar para qualquer lugar do Brasil. Em 12 meses eu o quito. Claro, vai ficar à minha disposição, porém não está no meu nome. Foi comprado para a...(ininteligível).

João: Há dois anos eu também comprei um jatinho executivo com oito lugares, zero quilômetro. Ainda não é o top de linha daquela empresa americana...(silêncio por alguns segundos) não lembro o nome, porém é muito confortável e a autonomia permite que eu faça Estados Unidos/Brasil sem escala. Mas é só o começo! Ninguém segura este servo de Deus! A concorrência que se prepare, pois eu vou ultrapassá-los. Não é verdade? (risos)

José: E como é que você está neste voo comercial São Paulo-Rio? Na realidade, foi providencial porque a gente pode bater esse papo e colocar as coisas em dia.

João: É que o piloto levou o aparelho para manutenção exatamente na semana em que eu tinha de fechar um grande negócio em São Paulo e um assessor incompetente – aliás, já demitido –, não me comunicou previamente. Bem, como ainda está cedo, vou aproveitar para curtir um pouco o sol do Rio, à beira da piscina, é claro. O dia está ótimo para uma boa caminhada na praia, mas a segurança...   

Neste exato momento do bate-papo, acenderam-se os sinais de “não fumar” e “apertar cintos” e o serviço de som do avião emitiu um rápido sinal sonoro. Em seguida, ouviu-se a voz do piloto: “Senhores passageiros, são 9 horas. Dentro de aproximadamente 10 minutos estaremos pousando no aeroporto do Rio de Janeiro. Atenção tripulação: ‘Preparar para pouso.’” Então, eu pensei: vou olhar disfarçadamente para trás para ver quem são estes dois senhores.

Acontece que, enquanto eu assim pensava, meu celular começou a tocar. Ao pegar o aparelho para atendê-lo, abri os olhos e, ainda meio sonolento e confuso, percebi que estava deitado em minha cama e o celular continuava tocando na mesinha de cabeceira ao lado. Olhei para o relógio e ele marcava precisamente 7 horas. Foi aí que me lembrei: na noite anterior eu havia programado a função despertar para 7 horas, pois tinha um compromisso no início da manhã.

Na verdade, tudo não passou de um sonho. E o livro? Estava no chão ao lado da cama.

Saulo Alves de Oliveira

NOTA: “Mundos Paralelos”, citado no início, não é ficção nem muito menos misticismo, é um livro de divulgação científica escrito pelo físico Michio Kaku.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

A face sinistra da natureza

Em um comentário anterior eu afirmei que a natureza me parece muito cruel e insensível. Na realidade a natureza é apenas indiferente à dor e também à alegria, ela não se comove quando os seres vivos sofrem ou mesmo quando estão felizes. Feita essa afirmação, vou contar um fato que eu presenciei aqui mesmo na cidade. Não precisei visitar as savanas africanas ou ir à Amazônia ou sequer caminhar nas matas próximas ao centro urbano onde moro. 

Eu resido nas proximidades de um terreno baldio. Na minha rua há muitos gatos. De vez em quando aparece um rato morto na garagem da minha casa. Eu acredito que os gatos pegam os ratos no dito terreno e depois vêm “brincar” e degustá-los na minha garagem. E são ratos até grandes, talvez meçam quase 25 cm do nariz à ponta do rabo.

Um dia eu encontrei apenas uma cabeça e em outra oportunidade apenas um corpo. É provável que outros roedores tenham sido totalmente devorados na minha garagem.

Na última quarta-feira, minha filha chegou do trabalho por volta das 19 horas. Ao entrar em casa, ela disse: “Tem um outro rato na garagem”. Bem, pensei, ele deve estar morto, então amanhã eu o enterrarei. E me esqueci do infeliz roedor.

No dia seguinte, por volta do meio-dia, eu fui até a garagem pegar alguma coisa no meu carro. E lá estava o rato num cantinho junto à parede. Entretanto o pobre animal não estava morto, pois o vi se mexer, não sei se eram espasmos. Certamente os gatos o maltrataram, imaginei, mas não o suficiente para matá-lo. O animal agonizava havia pelo menos 17 horas. Então, pensei: “O que devo fazer para acabar com o seu sofrimento? Eu não tenho estrutura emocional nem coragem para acabar com sua dor matando-o”. Pensei em levá-lo para o terreno baldio, mas, como era meio-dia e o sol estava causticante, julguei que o melhor seria deixá-lo ali mesmo, porquanto naquele local haveria sombra durante todo o resto do dia e ele poderia morrer de forma mais tranquila, se é que isso é possível.

À noite eu saí de casa. Retornei por volta das 21 horas e 30 minutos. Quando cheguei, percebi que havia dois gatos na garagem, mas não tinham tocado no rato. Aproximei-me do pobre animal, fiz algum barulho com os pés e notei que ele esboçou uma leve reação e entreabriu os olhos. Portanto, após 26 horas, no mínimo, a pequena criatura ainda estava agonizando.  

No dia seguinte, após o café da manhã, eu resolvi concluir a instalação de alguns acessórios nos banheiros dos meus filhos. Os banheiros foram reformados recentemente. Após tal providência, pensei: “Agora vou descer até a garagem para enterrar o rato.” Eu já estava com os materiais necessários nas mãos quando me dirigi à porta para descer a escada lateral. Já passava das 10 horas.

E eis que a nossa secretária abre a porta vindo da frente da casa. Ela tinha ido recolher as muitas folhas que caem de uma árvore que há na frente da nossa casa. Então, eu lhe perguntei: “Elizabete, você viu um rato lá na garagem?”, ao que ela respondeu “sim”. “Ele está morto?”, continuei. “Não”, disse ela. “O que você fez?”, insisti. “O coloquei num saco junto com as folhas”. Portanto, o animal ainda agonizava passadas cerca de 40 horas. A partir daí eu deixei de acompanhar seu sofrimento.  

Esse é apenas um caso entre muitos milhares ou, quem sabe, até milhões que acontecem todos os dias nas matas, florestas, selvas, nas caatingas, nas savanas, nos mares... e até bem próximo de nós. Quantos animais sofrem por horas e até dias a fio, com fome ou sede, machucados ou feridos, com dores excruciantes, antes de sucumbirem à morte! Para mim não há justificativa moral para tanto sofrimento. A Natureza – esse “ser” abstrato, invisível e intangível –, é implacável: quebrou uma perna, perdeu os dentes, está velho e sem força, ou doente, padeça então até a morte concluir seu trabalho, não importa quanto tempo arqueje moribundo.    

Talvez alguém esteja pensando: “Quanta bobagem! Você preocupado com um simples roedor! Há coisas muito mais importantes às quais devemos direcionar as nossas preocupações! Inclusive o rato é um grande transmissor de doenças para o ser humano!” É verdade, mas a culpa não é dele. Ele não criou a si próprio.

Eu não acho bobagem. E sabe o porquê? Porque por trás do pano de fundo do palco da vida há questões que dizem respeito à existência ou não de princípios morais no alvorecer de todas as coisas e depois na condução da vida. 

Você tem toda a liberdade de pensar o que quiser e de basear seu pensamento no que entender seja a verdade. Eu, porém, não acredito que Deus interfira nesses acontecimentos, pois se assim o fosse eu julgo que Ele seria um Ser cruel e de moral totalmente duvidosa. Para mim a explicação mais plausível é: evolução por seleção natural.

Saulo Alves de Oliveira

terça-feira, 22 de novembro de 2011

A natureza é bela, mas também é fera


O caribu, ou rena, vive em regiões frias, dentre elas o norte do Canadá e a Sibéria (Rússia). Seus principais predadores são os lobos e o homem.   

A natureza produz coisas maravilhosas e nos oferece imagens espetaculares. Muitos usam esse argumento para tentar provar a existência de Deus. Mas a natureza também produz coisas e imagens horripilantes e de uma brutalidade extrema. A natureza não é só bela, ela também é fera.

Quando criança, eu via minha mãe matar galinhas no quintal da nossa casa. Ainda na minha adolescência – convidado por um colega cujo tio era marchante –, eu fui a um matadouro assistir ao assassinato, ou melhor, ao abate de bovinos. Foi um espetáculo terrivelmente chocante e deprimente.

Na cadeia alimentar, há três tipos de animais: 1) os carnívoros, que se alimentam somente de carne, isto é, comem outros animais; 2) os herbívoros, que se alimentam de plantas; e 3) os onívoros, que se alimentam tanto de plantas como de outros animais. Nós, humanos (?), lamentavelmente estamos no terceiro grupo.

Infelizmente a evolução dos seres vivos na Terra conduziu-nos a essa chacina diária em todo o planeta. São as leoas que fincam seus poderosos dentes no pescoço da zebra e a sufocam até à morte. O leão, líder do bando, come primeiro e se empanturra de carne. Depois, toda a família felina estraçalha a vítima num ritual chocante que se repete há centenas de milhares de anos nas savanas africanas.

São os lobos – verdadeiros estrategistas – que perseguem o caribu (ou rena) até à exaustão, para depois devorá-lo ainda vivo, nas regiões geladas da Sibéria ou do Canadá.

Mas não é preciso ir tão longe para ver a natureza em toda sua plenitude “cruel” e sanguinária. É o gato que devora o rato todos os dias nas nossas casas ou nos terrenos baldios das nossas cidades. Não sem antes um ritual de pega, morde, solta e pega novamente, que leva o pobre roedor à exaustão e provoca certamente dores lancinantes, antes de ser mastigado pelos dentes afiados do pequeno felino.     

Mas, e se os leões e os lobos não matarem? Certamente morrerão de fome e não poderão alimentar seus filhotes para garantir a transferência de seus genes e assim perpetuar suas espécies.

A natureza é assim. Parece-me muito cruel e de uma selvageria atordoante. Quem fê-la assim? Na realidade a natureza não é boa nem má, ela é simplesmente indiferente. Ela não está preocupada com a zebra ou com o caribu que correm desesperados para não cair nas garras dos seus predadores, mas também não lhe toca o pavor dos filhotes de leão que são devorados pelas hienas. Nem quando os ursos devoram os lobos e seus filhotes.

É vida devorando vida para viver. É uma carnificina diária que choca as mentes mais sensíveis quando param para meditar.   

No entanto os animais irracionais matam por instinto. Instinto de sobrevivência, isto é,  ou matam ou morrem. A evolução os fez assim. Na natureza, sobrevivem apenas os mais fortes, os perfeitos, os melhores adaptados.

E o ser humano, mata por instinto ou por prazer?

Durante dezenas de milhares de anos, talvez cerca de 190.000 anos, os ancestrais do Homo Sapiens, nossa espécie, viviam como caçadores-coletores, isto é, caçavam e matavam animais selvagens para comer e também recolhiam aquilo que a natureza lhes oferecia gratuitamente para sua alimentação. A evolução fez do homem um comedor de carne, portanto o homem também matava por extinto de sobrevivência. A carnificina já vem de muito tempo atrás, bem antes do Homo Sapiens.

Há cerca de 10.000 anos começou o desenvolvimento da agricultura e o ser humano não precisava mais coletar frutos, raízes e vegetais na natureza. O homem passou a colher aquilo que plantava e a agricultura se desenvolveu por todo o mundo. Paralelamente a isso, passou a domesticar os animais e a usá-los em seu proveito, e a matança continuou. Agora era mais fácil, pois não precisava mais se arriscar na caça aos animais selvagens, correndo os perigos inerentes a tal atividade. Bastava ir até o pasto ou cercado e pegar uma ovelha ou um boi, aplicar-lhe alguns golpes com um machado – de pedra, naquela época – em sua cabeça e cortar-lhe a garganta, como ainda hoje se faz em muitos lugares pelo mundo afora.     

Nos tempos modernos ainda existem alguns poucos grupos humanos que vivem como se vivia há 10.000 anos – isto é, como caçadores-coletores –, valendo-se também de uma agricultura bastante rudimentar, sobretudo em regiões remotas da África, Ásia e mesmo do Brasil e outras regiões do mundo. Entretanto, nos dias atuais, especialmente nas regiões mais ricas, a quase totalidade das pessoas não precisa sair de suas casas para coletar ou caçar na natureza. Basta ir ao supermercado ou ao açougue na esquina. Muitos nem sequer têm a mínima percepção de que por trás daquele pedaço de carne há muito sofrimento.

Há alguns que caçam e pescam por esporte ou pelo simples prazer de ver o animal sucumbir sob o impacto de um tiro ou para contrabandear peles e outras partes exóticas de certos animais, o que é uma excrescência da civilização (?) humana.

Há aqueles que matam por prazer, especialmente alguns que estão ligados diretamente ao ritual do abate ou os pecuaristas, sejam eles pequenos ou grandes criadores, pois cada boi que tomba significa o aumento de sua conta bancária.
     
Há aqueles que, se não matam por prazer, ajudam a alimentar a matança, pois são grandes apreciadores dos prazeres da “carne” e em momento algum param para pensar em todo o sofrimento que o “dono” daquele “belo” churrasco sofreu até pouco antes de ser esquartejado.

Há aqueles que, como eu, não são grandes apreciadores da carne, mas, embora tendo consciência desse absurdo que a natureza produziu, ainda assim incluem em sua alimentação a proteína animal. E por isso alguém pode taxar esse comentário de hipócrita. E talvez com razão.

Entretanto, seja hipocrisia ou não, tudo o que eu disse acima pode ser resumido na seguinte frase: eu acho simplesmente uma das piores absurdidades e um despropósito o que a natureza produziu, isto é, seres vivos que necessitam sacrificar outros seres vivos para continuar vivendo.

Um dia, talvez daqui a 500 ou 1.000 anos, quando a humanidade tiver atingido a plenitude da consciência moral e entender que os animais têm direito à vida tanto quanto nós humanos, matar um animal será considerado um crime similar ao assassinato de qualquer ser humano. Ou, quem sabe, bem antes disso, quando a ciência tiver nos livrado da dependência da proteína animal, os nossos descendentes olhem para o passado e exclamem com indignação: “Como nossos ancestrais [inclusive nós, em pleno século 21] eram bárbaros!”

Saulo Alves de Oliveira

domingo, 13 de novembro de 2011

Filhos das estrelas



Imagem do Sol, a "nossa" estrela. O Sol tem cerca de 5 bilhões de anos e ainda "viverá" por mais 5 bilhões de anos.






Em um comentário anterior eu disse que nós somos “poeira das estrelas”, como afirmou o físico e astrônomo Marcelo Gleiser. Somos literalmente poeira das estrelas, pois os elementos químicos que compõem os nossos corpos foram todos produzidos em antigas estrelas que explodiram e arremessaram no espaço sideral enormes quantidades desses elementos, os quais alcançaram uma gigantesca nuvem de hidrogênio. E juntos, hidrogênio e outros elementos químicos, deram origem ao “nosso” Sol e à nossa Terra, que nos produziu e que é o lar de todos os seres vivos.

Para dar uma ideia melhor de como isso aconteceu, reproduzo a seguir um pequeno texto retirado do livro “Sinfonia das estrelas”, da astrofísica francesa Sylvie Vauclair, cujo título – Filhos das estrelas – tomei emprestado:  
Nosso corpo é feito de células vivas, constituídas por sua vez de aglomerados de moléculas muito complexas. As moléculas são o agrupamento de átomos, que compreendem cada um deles um núcleo atômico e os elétrons [os elétrons giram ao redor do núcleo]. Os núcleos atômicos são feitos de prótons e nêutrons, eles próprios compreendendo três quarks [cada próton e cada nêutron é formado por três quarks]. No estado atual de nossos conhecimentos, a hierarquia para neste nível. Não sabemos se os quarks são suscetíveis de divisão.

Os núcleos atômicos necessários a nossa existência não provêm do Universo primordial [o Universo nos seus instantes iniciais, logo após o Big Bang, a grande explosão que o originou]. Foi preciso que milhares e milhares de estrelas produzissem pacientemente, durante milhares de anos, o carbono e os outros elementos dos quais nosso corpo é constituído. Foi preciso em seguida que estes elementos, estes tijolos de base, ligassem-se entre si de uma maneira cada vez mais complexa para finalmente chegar ao que somos... e tal evolução não terminará conosco!

É que o formigueiro galáctico trabalha sem cessar. Assim que se forma uma estrela, depois do desabamento do gás interestelar, ela é estabilizada por sua pressão interna e adquire sua forma definitiva de esfera de gás incandescente [uma estrela começa a se formar quando uma descomunal nuvem de hidrogênio começa a implodir sob o peso da força gravitacional]. Contudo, ela continua a contrair-se lentamente, pois é o único meio que tem de equilibrar a energia que irradia – este é seu metabolismo! Ao mesmo tempo, sua temperatura interna cresce. Este período de juventude termina depois de alguns milhões de anos – um nada quando a duração de vida total da estrela é de 10 bilhões de anos! [o “nosso” Sol tem cerca de 5 bilhões de anos e ainda durará outros 5 bilhões de anos] É então que a estrela começa a realizar seu trabalho de formiga: sua temperatura central foi de fato suficiente para que se iniciassem as reações nucleares [que começam a transformar o hidrogênio em outros elementos].

O hidrogênio da estrela transforma-se de início em hélio, que se acresce àquele já presente desde o Universo primordial. Mais tarde, [as reações nucleares continuam e] o hélio transforma-se em carbono, azoto, oxigênio e em elementos cada vez mais pesados. Por fim, a estrela, exausta, explode se for muito densa ou, então, simplesmente se dissolve de novo no gás interestelar. No primeiro caso, sobrará no centro uma pequena estrela de nêutrons, muito densa, cujo potente campo magnético pode engendrar um pulsar. No segundo, restará uma pequena anã branca. Em todos os casos, uma grande parte da matéria que se encontrava na estrela primitiva acha-se misturada ao gás interestelar e vem alimentá-lo de elementos pesados. De lá nascerão novas estrelas que retomarão valorosamente a tocha!
Saulo Alves de Oliveira

Obs:
1 - As citações entre colchetes [ ] não são de responsabilidade da autora do livro.
2 - Se quiser ver uma imagem da formação de estrelas, sugiro clicar no link abaixo.

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Cristãos versus cristãos

Um homem subiu no púlpito de uma igreja e começou a fazer um sermão. No início, humilde. Depois, a soberba subiu-lhe à cabeça. Alguns pregadores são tão exagerados em sua jactância que eles próprios se autoproclamam porta-vozes de Deus. É como se eles reproduzissem aqui na terra, tal qual um alto-falante, exatamente aquilo que Deus fala em um microfone celestial. É como se a verdade fosse exclusividade sua. E isso não é tão incomum. Já vi vários que tocam esse limite.

(Uma pessoa abre a Bíblia e lê um texto. Em seguida faz sua interpretação da passagem lida e depois afirma que “foi Deus quem falou”. O que mais me impressiona é que quem usa da fala no momento seguinte, logo após “o alto-falante” de Deus, muitas vezes confirma: “Acabamos de ouvir a voz de Deus”. Na realidade Deus não falou coisa alguma. Apenas um ser humano deu sua interpretação acerca de um determinado texto bíblico.)

Foi apenas um parêntese. Voltando ao pregador. Lá pelo meio da pregação, com certa ironia e arrogância, ele disse – com trejeitos na voz, os quais não posso reproduzir por escrito –, que “não interessa o que se prega nas outras igrejas, mas apenas o que se prega na nossa igreja – não vou citar o nome – ‘pentecostaaaaaaal!’” Como se sua igreja fosse a depositária de toda a verdade bíblica.

No entanto, ao contrário do que pensa aquele pregador, eu julgo que interessa – e muito – o que as outras igrejas ensinam, pois na divergência de doutrinas há um grave e seríssimo problema para o cristianismo, haja vista que todos dizem ter como fundamento a Bíblia. E o Espírito Santo como revelador de suas verdades. Não vou nem entrar no mérito da questão relativa aos judeus que não aceitam o Novo Testamento como Palavra de Deus.

Outro pregador, ao ser questionado acerca da grande quantidade de igrejas cristãs com doutrinas tão divergentes, disse que “essa é a maneira que Deus utiliza para fazer sua mensagem ser divulgada em todo o mundo”. Com essa resposta, ironizou ele, “calei a boca do meu inquiridor”. Bem, quem o inquiriu pode ter ficado satisfeito. Quanto a mim, não.

Certa vez eu ouvi um pregador americano afirmar que Deus tem poder absoluto sobre todas as coisas e a ninguém deve qualquer satisfação. Sendo assim, Ele decide diretamente todas as catástrofes e mortes que acontecem no mundo, ou seja, o momento e a forma como qualquer ser humano morre, independentemente do grau de crueldade envolvida, são determinações exclusivas de Deus. Depois eu ouvi um outro pregador afirmar que Deus nada tem a ver com as catástrofes e mortes que acontecem no mundo, pois tudo é conseqüência das escolhas e do pecado do homem. O ponto basilar da questão é que ambos sãos cristãos e usam a Bíblia para fundamentar suas afirmações. Por conseguinte, algo está profundamente errado, pois as duas afirmações são conflitantes.

Outro exemplo. Se você conversar com um teólogo de determinada igreja ele vai tentar lhe provar, obviamente com a Bíblia, que as pessoas têm o dever de guardar o sábado. Se você conversar com um teólogo de outra vertente ele vai tentar lhe provar, também com a Bíblia, que os cristãos não têm obrigação de guardar o sábado.  O ponto crítico dessa questão também é que ambos sãos cristãos e usam a Bíblia para fundamentar suas afirmações. Algo também está profundamente errado, pois as duas afirmações são contraditórias.

Não interessa, para os meus propósitos, o que eu penso acerca dos dois conflitos acima. A grande questão é a seguinte: se a Bíblia é a Palavra de Deus, a Carta Magna de Deus ao homem, que indica o caminho para chegar até Ele, por que há tanta divergência de interpretação?

Eu vou citar uns poucos exemplos que são motivo de interpretações totalmente diferentes por parte dos cristãos. Talvez alguns não sejam nem tão importantes, mas devido a minha sofrível capacidade intelectual cito-os apenas para dar uma idéia do que estou afirmando:

. A guarda do sábado
. A glossolalia, ou seja, o dom de falar em línguas desconhecidas
. A doutrina da prosperidade
. A ordenação de mulheres
. A predestinação (doutrina que diz que uma vez salvo, salvo para sempre)
. A criação literal
. A virgindade de Maria, mãe de Jesus
. A veneração aos santos
. O batismo com o Espírito Santo
. O batismo de crianças
. O batismo por aspersão ou imersão
. O celibato
. Os milagres [não] são para hoje
. O dízimo [não] é para os dias atuais
. Condenação eterna versus aniquilação.

Veja bem, o meu raciocínio é simples. Suponhamos que você necessitasse escrever uma carta para algumas pessoas dando-lhes as diretrizes para chegarem a um determinado lugar. O que você faria? Eu imagino que você faria a carta mais objetiva possível, de modo que todos pudessem entender claramente o caminho para chegar ao destino final sem o risco de se dirigirem a lugares diferentes. Por que Deus assim não o fez? Eu não tenho a resposta definitiva, apenas uma hipótese.

Mas o caminho é Jesus!, você acaba de exclamar. Obviamente se é um cristão. E complementou: Ele mesmo disse “Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida; ninguém vem ao Pai, senão for por mim”. Sim, porém muitos que dizem seguir Jesus o fazem de uma maneira totalmente diferente de outros que também alegam que estão seguindo Jesus, inclusive de um modo diferente de você.

Eu tenho uma teoria do porquê isso acontece. Teoria como hipótese, não teoria científica com evidências que a comprovam. Talvez as grandes divergências entre as várias correntes cristãs sejam uma forte evidência a favor da minha teoria. Entretanto me reservo o direito de não abordá-la, pois não quero correr o risco de ferir sensibilidades ou, talvez, tocar na fé de alguém.

No momento, quero apenas fazer uma provocação ao leitor para meditar no tema e tirar suas próprias conclusões, se for do seu interesse, porquanto para mim talvez esse seja o maior problema do cristianismo.

Saulo Alves de Oliveira

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Sozinhos somos fracos, unidos somos fortes

E tudo começa com uma iniciativa, às vezes daquele que parece ser o menos indicado aos nossos olhos. Não precisa entender o idioma para compreender o grande significado da mensagem. Basta ver o vídeo. Dura pouco mais de 2 minutos.

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Senso moral ou delírio?

Existem diversas histórias bíblicas que há muito tempo me deixam estupefato. E, quando as analiso sob a ótica de um Deus justo, infinitamente bom e imutável, não encontro explicações plausíveis para tais histórias. São muitos e muitos casos, porém “en passant” eu vou citar apenas três.

Abraão, o grande Patriarca, mentiu em duas ocasiões diferentes ou, sendo mais condescendente, omitiu seu verdadeiro grau de parentesco com Sara, porquanto disse apenas que ela era sua irmã – se bem que, sendo filhos do mesmo pai mas de mães diferentes, de fato Sara era sua meia-irmã, porém também era sua mulher (Gn. 12:13-20 e Gn. 20.1-18). Eu não quero discutir as razões que o fizeram proceder daquela forma. O que eu quero ressaltar é o fato do Faraó e Abimeleque terem sido castigados porque a tomaram por mulher. E o mais grave: suas famílias também o foram. Talvez haja uma brecha para compreender a atitude de Abraão, mas não para a punição do Faraó e de Abimeleque e, em especial, suas famílias. Eu sempre me pergunto: por que Abraão – que não disse a verdade e valeu-se de meios, pelo menos, reprováveis –, saiu ileso das duas situações, além de rico?

Jacó, neto de Abraão, e pai do povo de Israel, perpetrou uma das maiores fraudes de toda a Bíblia, talvez a maior delas, e fez tudo com a conivência da sua mãe, Rebeca. Enganou o próprio pai, velho e cego, valendo-se de um embuste sórdido e condenável sob todos os aspectos (Gn. 27:1-29). E ele não o fez por inocência, pois tinha consciência do seu gesto vil! (Gn. 27:12). Eu sempre me pergunto: por que Isaque, seu pai, ao descobrir a farsa, não anulou a bênção de Jacó, transferindo-a em seguida para Esaú, já que a atitude do segundo filho teve como fundamento uma mentira repugnante?

Davi, o “eterno” rei de Israel, tão decantado por suas proezas, cometeu alguns crimes. Não vou nem citar o caso de Urias e Bate-Seba, pois a história é bem conhecida. Quero me referir a um episódio que está lá entre as guerras que ele empreendeu e que talvez as pessoas leiam e não percebam o grau de crueldade envolvido. “E Davi jarretou a todos os cavalos dos carros [dos seus inimigos], reservando apenas cavalos para cem carros” (II Sm. 8:4). Jarretar é cortar importantes tendões e nervos que há na articulação das pernas posteriores do cavalo e que têm um papel fundamental na locomoção do animal. Com os jarretes cortados o cavalo não pode nem ao menos andar. Certamente não é um absurdo admitir que aqueles animais morreram de fome e de sede prostrados no chão, sangrando talvez por vários dias, ou então foram devorados vivos por predadores. Portanto, eu pergunto: mesmo sendo uma prática comum em tempo de guerra naquela época, não foi um ato de extrema crueldade?               

No entanto eu quero me deter em uma quarta história, a qual eu reputo como sendo uma das mais terríveis. Ela diz respeito a Moisés, o grande legislador do antigo Israel.

Segundo a Bíblia (Nm. 25:1-3), os israelitas estiveram acampados num local chamado Sitim poucos antes de entrarem em Canaã e lá se relacionaram sexualmente com mulheres moabitas, que também os “convidaram” a prestar culto aos seus deuses. Faço questão de destacar a palavra “convidaram”, pois isso quer dizer que o povo de Israel não foi obrigado a qualquer prática contrária à sua fé, mas o fez espontaneamente, porquanto eram adultos capazes de distinguir o direito do esquerdo.

Por esse motivo, isto é, por que as moabitas “seduziram” os israelitas a seguir outros deuses, Moisés recebeu posteriormente do Senhor, como última missão de sua vida, a incumbência de vingar-se dos moabitas. Em Nm. 31:1, a Bíblia refere-se aos midianitas, mas, pelo contexto, deduz-se que eram os mesmos moabitas com os quais os israelitas se relacionaram em Sitim.

Todavia, independentemente de qualquer distinção entre midianitas e moabitas, o que interessa é que Moisés destacou um exército de 12.000 homens e o mandou investir contra os midianitas e o resultado é que os soldados israelitas mataram todos os homens adultos de Mídiã e queimaram todas as suas cidades e acampamentos. Entretanto, no que pareceu ser um lampejo de lucidez, os comandantes do exército decidiram preservar todas as mulheres e crianças.

Moisés, no entanto, quando tomou conhecimento do ocorrido, indignou-se contra os oficiais do exército que voltaram da guerra. Na realidade não foi uma guerra, foi um verdadeiro massacre, porquanto nem um guerreiro israelita morreu (Nm. 31:48, 49). Moisés então ordenou aos seus soldados que matassem todos os meninos (sic) – os “homens” que restaram – e também todas as mulheres, exceto as virgens, o que incluía logicamente as crianças do sexo feminino. Como os soldados israelitas fizeram para identificar todas as virgens? Não faço a menor ideia.        

É muito provável que muitas pessoas leiam essa história e não parem para meditar na barbárie que ela encerra. Aquelas mulheres e crianças evidentemente já estavam traumatizadas pelo que presenciaram, isto é, a morte brutal de seus pais, maridos, irmãos ou filhos maiores e pela perda de todos os seus bens. Então chegaram os soldados de Israel armados com espadas e lanças e investiram contra elas e seus filhos. Eu imagino o terror e o desespero de todas aquelas criaturas.

Talvez uma mulher correu com seu filho e foi traspassada pela lança arremessada por um dos soldados e em seguida a criança teve a cabeça decepada pela espada de outro algoz.    

Quiçá uma outra mulher tentou se esconder com seu filho recém-nascido e foi puxada pelos cabelos e em seguida cortada ao meio pela espada do seu agressor. É perfeitamente razoável admitir que a criança pode ter sido simplesmente pisoteada, tendo o crânio esmagado pelos fortes pés do soldado, ou então foi jogada com força contra rochas existentes no local.

Parece que eu vejo os guerreiros brandindo suas espadas ao desferir os golpes e os corpos caindo à sua frente, mutilados e esvaindo-se em sangue. Parece que eu vejo os soldados israelitas totalmente banhados com o sangue de suas vítimas e, quem sabe?, felizes por estarem chacinando os seguidores de outros deuses. De acordo com Nm. 31:35, só as virgens poupadas somavam 32.000 pessoas, portanto não é uma ilação irresponsável  admitir-se que naquele dia muitas dezenas de milhares de pessoas foram cruel e covardemente massacradas. Um espetáculo chocante e deprimente e que eu jamais gostaria de presenciar.

Em que pese a atitude dos homens e mulheres moabitas, há como justificar o que fez Moisés e seu exército? Para mim a resposta é um retumbante não. Não há, não houve e jamais haverá como justificar o assassinato de seres humanos indefesos, desarmados e, em especial, inocentes.  

Eu tenho absoluta certeza de que qualquer estudioso cristão da Bíblia, não precisa ser um grande apologista, vai encontrar uma série de justificativas para todos os atos que eu citei. Entretanto, eu pergunto: se Deus é o mesmo sempre, há razão para o erro de hoje não ter sido erro no passado? Hoje, sob o ponto vista da moral, tais procedimentos são injustificáveis. Hoje, se vivo fosse, certamente Moisés seria julgado por crimes contra a humanidade.

Ou o meu senso moral é um delírio?

Saulo Alves de Oliveira

domingo, 9 de outubro de 2011

Coragem para mudar

Na última sexta-feira eu recebi uma mensagem de um colega do Banco do Brasil cujo nome é Douglas Scortegagna. A mensagem tem o título “Coragem para mudar” e tem relação com a série de denúncias que envolvem membros do governo da Presidente Dilma Rousseff. Por ser do interesse de todos os brasileiros honestos, reproduzo a seguir, sem alterações ou correções, parte do texto com a qual tenho total identificação.
"(...) Aos poucos fui reconhecendo que a propalada competência da secretária de Minas e Energia, no Rio Grande do Sul, da ministra de Minas e Energia e da ministra-chefe da Casa Civil, no governo federal, que virou presidente sem nunca ter disputado uma eleição, se confirmava e tinha vindo para dar seu recado aos aproveitadores da Nação, confiantes na impunidade e se valendo da fraca memória dos eleitores. Dilma começou a dar um BASTA às falcatruas.

Tinha de começar por algum lugar. E começou exatamente naquele ministério que ficou famoso desde os tempos do ministro 10%, assim conhecido em uma ilação à taxa que, segundo diziam, cobrava a título de propina das empreiteiras. Agora resta ver se terá a frieza e a tenacidade necessárias para enfrentar todos os dissabores da corajosa decisão.

Faço-lhe um apelo, presidente Dilma, que certamente é o clamor de todo povo brasileiro: não se intimide! Que não lhe falte coragem. Vossa Excelência terá o apoio de todos, menos dos interessados em continuar mamando nas gordas tetas do governo.

Voltei a acreditar outra vez que o Brasil está recebendo nova chance de ser salvo. Os desonestos deverão tomar outro rumo, pois em nossas deploráveis cadeias já não cabem mais tantos bandidos.
Chega de “laranjas”, “aloprados”, “sanguessugas”, “vampiros” e outras categorias de espertalhões que, usando de cargo público, locupletam-se desavergonhadamente, já não mais às escuras, mas às claras, com filmagens e tudo mais, e nada lhes acontece. Ou nada lhes acontecia. O ex-presidente Lula, em palestra na Escola Superior de Guerra, recentemente falou e eu assino embaixo: “O importante é que, na medida em que haja uma denúncia, você investigue, apure. Se as denúncias forem verdadeiras, quem cometeu o erro paga. Se a pessoa for inocente, ela volta para seu trabalho”.

Avante, Dilma! Se somente fizeres uma faxina no governo, retirando ou inibindo a ação dos corruptos, já terá cumprido grande parte de sua nobre missão. O povo honesto e trabalhador, que é a maioria dos brasileiros, muito lhe agradecerá."
Saulo Alves de Oliveira

domingo, 25 de setembro de 2011

Carta à minha Neta - O Ano-luz

Galáxia de Andrômeda, localizada a uma distância de aproximadamente 2,5 milhões de anos-luz da Terra

Querida Paola,

Em uma carta anterior eu contei a você algumas coisas acerca da Luz. Disse-lhe que a velocidade da Luz no vácuo é 300 mil quilômetros por segundo. Para dar uma ideia melhor do que isso representa, propus um pequeno experimento mental que nos levou à conclusão de que um foguete, deslocando-se a essa velocidade, daria sete voltas e meia ao redor do equador terrestre em um segundo (a circunferência da linha do equador mede aproximadamente 40 mil quilômetros). Algo realmente fantástico.

Agora as coisas são um pouquinho mais complicadas.

O Sol é a “nossa” estrela. É aquele “bonitinho” – palavra que você gosta muito de pronunciar – que lhe causa manchas avermelhadas quando você vai à praia sem protetor especial. A Terra caminha no espaço girando ao redor do Sol presa pela força gravitacional. O Sol é uma gigantesca bola de gases incandescentes – cerca de 91,2 % de hidrogênio,  8,7% de hélio e 0,1% de outros elementos. Seu diâmetro tem cerca de 1,4 milhão de quilômetros. Dentro do Sol cabe algo em torno de 1,3 milhão de planetas iguais à nossa Terra. O “nosso” Sol fica a aproximadamente 150.000.000 de quilômetros da Terra. Mesmo a uma velocidade fantástica, a luz do Sol demora cerca de 8 minutos para chegar até nós.

Vamos fazer um pequeno experimento mental para dar uma idéia melhor do que isso representa. Vamos supor que o Sol é uma lâmpada acesa e que está conectada a um interruptor aqui na Terra. Ao acionarmos o interruptor, desligamos o Sol imediatamente (claro que isso é impossível, há leis físicas que o proíbem, mas lembre-se: nós estamos fazendo um experimento mental). O que aconteceria se isso fosse possível? Se você estivesse tomando banho de mangueira no quintal da nossa casa num sábado pela manhã, você poderia continuar a fazê-lo normalmente por 8 minutos, até subitamente a luz desaparecer e tudo ficar escuro como breu. Então você daria um grito enorme chamando a mamãe ou o vovô.           

O Universo é tão vasto, tão extraordinariamente vasto que, mesmo à velocidade da luz, qualquer nave levaria 4,3 anos para chegar à estrela mais próxima, Alfa Centauro, cuja distância à Terra é de aproximadamente 40.680.000.000.000 de quilômetros.
[O Alfa Centauro] É na verdade, um sistema triplo, duas estrelas girando uma em torno da outra, e uma terceira, a Próxima Centauro, orbitando o par a uma distância discreta. Em algumas posições em sua órbita, a Próxima é a estrela conhecida mais próxima do Sol, justificando o seu nome. [O interessante é que] A maioria das estrelas no céu é parte de sistemas duplos ou múltiplos. Nosso solitário Sol é quase uma anomalia (Carl Sagan, em Cosmos).
Um dia quando você estiver maior eu lhe apresentarei a fantástica obra de Carl Sagan.

Você já imaginou se nós tivéssemos três sóis? Seria bastante interessante, não acha? Talvez sempre fosse dia aqui na Terra.

E só na galáxia da Via Láctea – onde se localizam a nossa Terra, a nossa cidade, a nossa casa e todas as pessoas que conhecemos ou ouvimos falar –, existem cerca de 200 bilhões de estrelas. Dá-se o nome de galáxia a um agrupamento enorme de estrelas.

Andrômeda, a galáxia grande mais próxima da Via Láctea, está localizada a “2.500.000 x 9.460.800.000.000” de quilômetros. Certamente você ainda não sabe fazer essa conta, mas fique certa que o resultado é um número enorme. Tratando-se de Universo, os números são literalmente astronômicos.   

Veja bem: essa é a distância de uma das galáxias mais próximas à Via Láctea. E para complicar: há estimativas que se referem a centenas de bilhões de galáxias no Universo conhecido, cada uma com centenas de bilhões de estrelas.
De acordo com um cálculo feito em 2003 por astrônomos da Universidade Nacional da Austrália, o número de estrelas no Universo conhecido pelo homem, visíveis pelos mais modernos telescópios, seria de 70 sextilhões, ou 7 seguido de 22 zeros (do livro Poeira das estrelas, de Marcelo Gleiser).
Os objetos mais distantes já descobertos pelos cientistas no Universo estão tão longe da Terra que a distância que nos separa deles, em quilômetros, é da ordem de grandeza de 1 seguido de 23 zeros. Estou complicando muito, não é Paola?

Como você já percebeu, quando a gente se refere ao Universo os números são realmente superlativos, inclusive no que tange às distâncias. Por esse motivo, para facilitar as coisas, os cientistas criaram o Ano-luz, que é uma unidade de medida de distâncias, tal qual o metro ou o quilômetro. Só que 1 Ano-luz é a distância que a Luz percorre em um ano. Seu cálculo é feito multiplicando-se os seguintes termos: 365 x 24 x 60 x 60 x 300.000, cujo resultado é 9.460.800.000.000, ou seja, 1 Ano-luz corresponde a quase 9,5 trilhões de quilômetros.

Portanto, para concluir – e para não cansá-la –, vou relacionar abaixo algumas distâncias em Ano-luz (números aproximados):
1) do Sol à Terra: 0,0000158 anos-luz (ou 8,3 minutos-luz)
2) do Sol a Plutão: 0,000625 anos-luz (ou 5,5 horas-luz)
3) do Sol ao centro da galáxia da Via Láctea: 26 mil anos-luz
4) diâmetro da Via Láctea: 100 mil anos-luz
5) da Via Láctea à galáxia de Andrômeda: 2,5 milhões de anos-luz
6) do objeto mais distante descoberto pelos cientistas: 13 bilhões de anos-luz. 

É, minha Netinha, o Universo é realmente de uma grandeza incomensurável. E, diante de sua magnitude, nós, seres humanos, somos pouco mais do que o nada. Somos “poeira das estrelas”, como afirmou o físico e astrônomo Marcelo Gleiser. Somos literalmente poeira das estrelas, pois os elementos químicos que compõem os nossos corpos foram todos produzidos em antigas estrelas que explodiram e arremessaram no espaço sideral enormes quantidades desses elementos, os quais alcançaram uma gigantesca nuvem de hidrogênio. E juntos, hidrogênio e outros elementos químicos, deram origem ao “nosso” Sol e à nossa Terra. A querida Terra que nos produziu e que é o lar de todos os seres vivos.

Um beijo do seu avô,

Saulo