“... Mas às vezes nos assusta e nos abala”, disse minha amiga.
Não só nos assusta e nos abala, minha amiga. Também nos faz
refletir e nos transforma. E às vezes interfere em nossa relação com o próprio Deus.
Os juízos de Deus não caem ou caíram apenas sobre os
rebeldes. Muitos inocentes pagaram por crimes ou pecados que não cometeram. Não
há como fechar os olhos a essa realidade. Apenas os que sofrem da síndrome do avestruz,
que enterra a cabeça, como diz a lenda, não percebem essa verdade tão dura, porquanto
está claramente registrada nas páginas da Bíblia em todo o VT. Há inúmeros casos
na Bíblia que são moralmente inaceitáveis. E a grande maioria dos crentes hoje
é incapaz de sentir a dor daqueles povos antigos castigados por Deus de forma
tão cruel. Ao contrário, se regozija com a condenação dos “maus”. Mas, será que
todos os “rebeldes” eram maus?
Ao analisar uma determinada situação eu tento sempre me
colocar no lugar do outro. Assim eu consigo avaliar melhor como me sentiria se
estivesse do outro lado. Tente essa experiência.
Ao fazer isso, procure se livrar, pelo menos por alguns
instantes, de toda a carga de doutrinação que você e eu recebemos ao longo das
nossas vidas. Por experiência própria sei que não é fácil, porém, com muito
esforço, tenho conseguido. Esforce-se por se sentir apenas um observador
independente, livre da doutrinação a favor ou contra.
Há inúmeros casos na Bíblia que poderiam ser apresentados, mas,
para ser conciso, vou citar apenas um. O caso da saída do povo hebreu do Egito.
Coloque-se no lugar de uma mulher egípcia ou de seu filho primogênito, ou mesmo,
por que não dizer, de um homem egípcio.
Quantos inocentes, seres humanos e animais, foram mortos
pelas famosas “pragas do Egito”? E o
pior: o próprio Deus endureceu o coração do Faraó para que ele não cedesse e
deixasse o povo israelita sair daquelas terras. Deus endurece por várias vezes o coração do Faraó para em seguida
castigar duramente o povo egípcio e assim matar certamente milhares de
inocentes, seres humanos e animais.
Confesso: minha percepção, posto que sou apenas um reles
mortal, não alcança a justeza de tais atos.
E a história culmina com a morte de todos os primogênitos –
inocentes, repito –, resultado do endurecimento do coração do Faraó provocado
pelo próprio Deus (sic).
Você consegue se colocar no lugar de uma mãe egípcia? Ou de
uma criança egípcia primogênita, que pagou por algo que não tinha nada a ver?
Por que Deus não foi seletivo e castigou apenas os maus?
Acho que jamais entenderei seu decreto.
Eu imagino quantos jovens e crianças foram dormir felizes e
alegres juntamente com seus pais naquela fatídica noite. E, na madrugada do dia
seguinte, estavam todos mortos.
E não foram mortos apenas seres humanos. Os primogênitos dos
animais também foram eliminados. Por quê?
Eu fico a pensar no que os filhos dos egípcios poderiam perguntar
a Deus se pudessem falar depois de mortos. São apenas conjecturas que não posso evitar.
“Jeová, por que Tu nos mataste ainda tão jovens, com tantos
planos a realizar? Que crime cometemos?”
E as crianças: “Nós nem sabíamos quem era Faraó” ou “Nem
sequer sabíamos o que significava povo hebreu” e “Tu, Jeová, ceifaste as nossas
vidas ainda na mais tenra idade, quando muitos de nós nem ao menos tínhamos
dado os primeiros passos ou balbuciado as primeiras palavras”.
Não há justificativa moral alguma para essas mortes. Por
isso os crentes apelam, como último recurso, e para se sentirem bem com suas
consciências ou para não sofrerem o “castigo” do Todo-poderoso, para a
soberania de Deus, isto é, Deus mata quem Ele quiser, quando quiser e como
quiser, não importando o grau de sofrimento e injustiça contido nessa ação.
Deus, pois, é soberano até para fazer um inocente pagar pelo
pecado de outrem (sic).
E assim as pessoas aceitam com toda a naturalidade as
terríveis histórias de genocídios, extermínios, assassinatos e crueldades
cometidos contra seres inocentes no VT.
Felizmente, eu já ultrapassei essa etapa na minha vida há
alguns anos e hoje não me conformo mais com essas justificativas.
Se eu tenho alguma explicação para tais fatos? Talvez. Mas
aí fica só comigo e Deus.
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