Eu tenho a impressão de que – posso estar
totalmente enganado, admito –, parece que um dos motivos porque muitos crentes estão
se mostrando tão animados com a possível eleição da Marina é a expectativa de
que, caso ela ganhe a eleição, passe a governar o Brasil com a Constituição de
um lado e a Bíblia do outro.
(É claro que há muitos outros motivos,
como, por exemplo, o ódio visceral ao PT, como se todos os milhões de petistas
formassem uma legião satânica, o que não me cabe aqui questionar.)
Eu também tenho a impressão de que algumas
pessoas não sabem o que é um Estado laico. Estado laico é o Estado que não é
nem ateu nem religioso, isto é, não privilegia nenhuma religião em detrimento
de outra, e nem o ateísmo ou a falta de religião.
A propósito disso, eu pergunto para os
evangélicos de um modo geral, se bem que nem estes se entendem quanto à
interpretação da Bíblia:
1. Se por acaso elegêssemos um presidente
da república muçulmano, você concordaria que ele tomasse decisões baseadas no
Alcorão para governar o Estado brasileiro?
2. Se o eleito fosse um judeu, você
concordaria que ele tomasse decisões baseadas na Torá, ou mesmo somente no
Velho Testamento, estabelecendo, por exemplo, a proibição quanto ao consumo de
carne de porco?
3. Se fosse o caso de uma presidente da
república adventista do 7º dia, você concordaria que ela tomasse decisões
baseadas na lei mosaica, estabelecendo, por exemplo, que o dia semanal de
descanso passasse a ser, obrigatoriamente, o sábado para todos os brasileiros?
4. Ou se elegêssemos uma testemunha de
Jeová, você concordaria que ela mandasse para o Congresso Nacional um projeto
de lei proibindo, para todos os brasileiros, a transfusão de sangue em
quaisquer situações? Para quem não sabe, essa proibição é baseada na
interpretação que eles fazem de textos bíblicos.
E assim eu poderia citar várias outras
religiões ou crenças, como os católicos, os espíritas, os cultos afros, etc.
É claro que um presidente da república pode
se basear em textos bíblicos, desde que estes textos contenham “regras” ou
“mandamentos” universais, isto é, que sejam aceitos pacificamente em todo o
mundo. Exemplo clássico: amar ao próximo como a si mesmo. Agora, impor regras
específicas de uma religião para todo o povo brasileiro é algo inviável e
irracional. Aquilo que é específico de uma religião, que seja praticado na sua
igreja, no seu templo, na sua mesquita, na sua casa e na sua vida particular,
não no Palácio do Planalto, no Congresso Nacional, nas repartições ou escolas
públicas.
Não entender isso é contribuir para que o
Brasil se transforme em uma
Nação onde grupos religiosos se digladiem e se agridam por
conta de suas convicções religiosas. E, lamentavelmente, parece que alguns
pastores, pessoas inteligentes e com boa formação intelectual, estão,
irresponsavelmente, incentivando essa perigosa experiência.
Há até alguém fazendo uma associação de
Marina com os juízes do Velho Testamento, como se Deus fosse levantar a “juíza”
Marina para converter todo o povo ao cristianismo, “evangélico”,
ressalte-se.
O interessante é que eu fiz as duas
primeiras perguntas acima a um amigo e ele disse que eu estava sendo
fundamentalista. Sinceramente, não entendi.
O Brasil é uma democracia, com suas muitas
falhas e algumas virtudes. Ainda não conseguimos acabar com a miséria e com a
grande concentração de riqueza nas mãos de uns poucos. Devemos lutar para que
os ricos fiquem menos ricos e que não haja pobreza e miséria em nosso País.
Que ninguém ganhe menos que X, sendo X o
salário capaz de proporcionar a uma família média as condições de viver com
toda a dignidade. E que, em quaisquer situações, ninguém ganhe mais do que 10X,
20X... ou seria 30X? Não sei. O que sei é que é preciso estabelecer um padrão
de ganhos mínimo e máximo para todos os seres humanos, deem a isso o nome que
julgarem melhor.
O Brasil é uma democracia, apesar dos
saudosistas da ditadura. E é bom que continue assim.
Todos temos o direito de votar em quem
julgamos seja o melhor para o País, ainda que errando. Marina, Aécio, Dilma... Só
não podemos correr o risco de misturar política com religião, sob pena de
voltarmos ao obscurantismo dos tempos medievais ou seguirmos o exemplo de
alguns países do oriente onde, neste momento, religião e política se confundem
numa verdadeira barbárie.
“Marinar” faz parte do “jogo” democrático, assim como
“dilmar” ou “tucanar”. O que não faz parte é achar ou pensar que Marina, se
eleita, vai empunhar a Bíblia como a “espada” do Espírito e liderar os “cruzados”
evangélicos, evidentemente, para livrar o Brasil dos “hereges” das outras crenças ou sem
crenças.
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